Anotações

Anotações sobre Ostapesacervo 
Claudio Boeira Garcia 1

As notas que seguem se amparam em informações e lembranças suscitadas por documentos e por minha experiência de pertencimento aos Tapes. Sobretudo, em minha disposição de honrar razões pelas quais, nossa obra e andanças, ainda pulsam em nós, e em pessoas com as quais as partilhamos. 

Rememorar eventos nos quais atuamos, nos lança em turbilhões de sentimentos e de reflexões acerca de nossas relações com o mundo e com pessoas sem as quais eles não teriam acontecido, nem poderiam ser lembrados. Efemeridade, contingência, sentir, criar, pensar, lembrar e esquecer, são traços e capacidades que distinguem nossa condição. Atores, testemunhas e intérpretes de iniciativas não controlamos seus significados disponíveis às interpretações em outros tempos e contextos, pois os mundos que carregam continuarão acessíveis enquanto persistirem indícios de teias mundanas nas quais elas se constituíram. Experientes em pensar sobre nesses assuntos, Antigos Gregos, com exemplar sabedoria, incumbiram os istorien de preservar na memória eventos com alguma relevância pública. Recomendaram a imparcialidade como disposição capaz de garantir, razoável afinidade, entre fatos e narrativas. Não imaginavam tragédias morais e públicas que mentiras deliberadas produziriam no decorrer dos séculos. Sobre essas sensatas recomendações encontramos eco e conforto nas palavras que ouvíamos de nossos maiores, desde nossas infâncias: no longo prazo, a verdade, não a mentira prevalece!

Por quase sessenta anos, por laços familiares, de amizade e pelas brisas que sopram nos campos, coxilhas, açudes, ruas e beira d`água da Lagoa, meus retornos, breves ou alongados a Tapes foram constantes. Desde 2019, encerradas minhas atividades acadêmicas, fixei-me, em tempo integral, nos “pagos em que nasci”. Tempos de saudades e lembranças dos que se foram, de reencontros com conterrâneos de várias gerações, de conversas, também, com parceiros e testemunhas de estórias de Os Tapes. A proximidade de baús, caixas, gavetas e pastas aguçaram o sentimento de urgência em dar destino aos documentos, que, com alguma ordem, guardei e ampliei ao longo de mais de 50 anos. Quase todos estavam razoavelmente preservados, entre eles, correspondências, fotos, textos de jornais e revistas, cartazes, registros em cassete de apresentações ao vivo e entrevistas sobre festas, música, versos populares e estórias sobre arte na região onde viveram nossos ancestrais:2 Tapes, Arambaré, Dores de Camaquã, Barão do Triunfo, Sertão Santana, Cerro Grande do Sul, Barra do Ribeiro e Guaíba Entre devaneios e reflexões desencadeadas ao ler, olhar e manusear cartas, fotos, cassetes e cartazes, lembrei de rememorações de Walter Benjamin sobre a experiência de remexer gavetas, a temporalidade da condição humana e relação da tecnologia com a expansão das possibilidade de acesso as formas de arte. Nas minhas circunstâncias, mais que devaneios sobre minhas de lidar com documentos antigos, me alegrava que a tecnologia pudesse contribuir não só para preservar rastros da atividade de Os Tapes, mas, sobretudo indícios das redes de acontecimentos e de iniciativas em meio às quais nos movemos nas décadas de 70 e 80. Para mim, foi em tempos de disponibilidade para devaneios e atividades condizentes à vida do espírito3 , que Ostapesacervo nasceu em uma trama de acasos, intenções e circunstâncias que propiciaram o encontro entre mim e Camila Padilha Costa, formada em geografia pela UFRGS e mestranda pela UNILA, que chegou em Tapes, em busca de informações sobre o município e, também, sobre Os Tapes referentes ao seu projeto de Dissertação de Mestrado. Em suas primeiras palavras, no que diz respeito às informações sobre o Grupo, soube que poderia lhe propor juntar nossos ânimos e esforços para dar destino público aos documentos disponíveis. Devido à relevância, para sua pesquisa, dos documentos que eu mantinha em uma casa onde significativa parte do acervo estava guardado e, durante dois anos, em processo de imersão e distanciamento4 examinamos, selecionamos e organizamos os documentos centrados em três focos orientadores, quais sejam: integrantes e colaboradores de Os Tapes, Projetos (oito mais duas retrospectivas), registros fonográficos e apresentações5. Depois de digitalizados ou digitados os textos dos projetos e obras identificadas fotos, Jornais, cartazes etc., chegou o momento de procurar um/uma Web Designer. Convidei para este encargo outra Camila, sobrinha que vive na Irlanda e atua na área. Feito o convite, com emoção ouvi que encontraria, ao lado de suas ocupações profissionais e privadas, gosto e alegria em contribuir com o projeto. Durante um ano, com aguda disposição hermenêutica e exemplar estética cartesiana, Camila, em constante interlocução comigo e participantes do projeto, a passagem/tradução do acervo à versão digital a qual, a partir de hoje 08 de setembro de 2023 acesso universal.

1 As notas inscritas em Ostapesacervo começam a ser redigidas em fins de 2019, quando Camila Padilha Costa aceitou o convite para preservarmos, mediante digitalização, expressiva documentação sobre Os Tapes e que se fez relevante, também, para sua investigação de Mestrado. A bem-vinda parceria com Camila, me lançou em torrentes de rememorações estimuladas pelas atividades de prescrutar, selecionar, ordenar e, no meu caso, também de indagar e de escrever notas entre dezembro de 2019 e Agosto de 2023. Anos serenos e palpitantes habitados por conversas com participantes e testemunhas de Os Tapes. Tempos de remexer baús e caixas, de devanear, anotar, lembrar, conferir, selecionar e organizar itens sob formas adequadas. Concluída esta fase, convidamos Camila Kramm Garcia Bazetto que, no período de um ano, se apropriou de Ostapesacervo e o traduziu à esfera das artes digitais.
2 Por mais de 50 anos documentos com suporte gráfico ou em fitas cassete permaneceram guardados em minha casa na Vila dos Pescadores, no Balneário Rebello, outra em Ijui até 2010 quando foi transferida para minha residência no Pontal em Tapes.
3 Nos termos das faculdades da vida contemplativa de Hannah Arendt.
4 O Impacto e estímulo que os documentos produziram em meus sentimentos e na atividade de rememoração e em nosso zelo investigativo afinou nossa disposição de prescrutar palavras e expressões-chave que orientaram à criação da obra, registros e apresentações do Grupo. Com raras pausas, em 2021 e 2022, identificamos e articulamos os documentos examinados ao ponto de estarmos seguros de constituir, fundamentada e consistente versão de “estórias de Os Tapes” focalizada na identificação de seus integrantes, formações, colaboradores, projetos obras, viagens e apresentações.
5 Equipe de Ostapesacervo: Camila Costa Padilha, digitalização e organização de Ostapesacervo; Camila Kramm Garcia Bazetto – Web Designer – Concepção e Arte Digital; Claudio Boeira Garcia, organização de Ostapesacervo e textos, Ercília Ana Cazarin e Fernanda Rodrigues Garcia. revisão de textos, Claudio Boeira Garcia, Cristiano Garcia Heredia, Otacílio Lopes Meireles e Silvio Luis Pereira seleção e revisão de áudios incorporados ao acervo.

Memória e Gratidão

Este Acervo é dedicado aos Tapes, aos nossos familiares, às pessoas com as quais compartilhamos palavras, versos, cantorias e iniciativas; àquelas que nos escutaram, escreveram textos, noticiaram, teceram e bordaram nossos palas e vinchas, fotografaram, criaram cenários e cartazes, nos hospedaram em suas casas, auxiliaram a carregar e montar instrumentos, cuidaram de idas e vindas aos nossos destinos; aos dirigentes e auxiliares de instituições, diretórios, centros acadêmicos, teatros, naves e criptas de igrejas, sedes de clubes recreativos, ginásios, praças, parques, ruas e galpões. Às pessoas que encontramos nos caminhos nos quais, arte e vida celebram suas demandas, também nosso afeto, já ancestral, para quem, por acaso, acesse estes documentos.

Às pessoas não citadas nosso carinho e agradecimento, sem medidas, por vossas parcerias nos versos que cantamos e nas alegrias e expectativas que partilhamos….

Adelino Souza, Adenur Ruskowiski, Adriano Pinzon Garcia, Agostinho Genisch, Águeda Kalata, Airton Pimentel, Alcides Fernandes Garcia, Alcir Quadros Brito, Almôndegas, Alonso Coutinho, Aluísio Palmar, Amarildo Mazzuco da Silva, Amir Limana, Ana Dal Ben, Ana Dolores Boeira, Ana Fricke Matte, Ana Julia Tiellet, Ana Maria Colling, Ana Tereza Pereira Neto, Anarolino Fernandes Garcia, André Ferreira, Angello Lacocca, Anselio Brustolin, Antonio Augusto Fagundes, Antonio Carlos Boeira Garcia, Antonio Carlos Passos Cardoso, Antonio Carvalho de Assis, Antonio Grison, Antonio Hohlffeldt, Antonio Leutchuck, Antonio Mahfuz, Antonio Vanderli Moreira, Aparicio da Silva Rillo, Aquiles Ferreira, Arlete Teixeira Buchmann, Armando Lobo Silvam, Arnildo Pommer, Arno Rochol, Assis Hoffmann, Assunta Campilongo, Atanasio Orth, Ballet de Brandsen, Bendengó, Berenice Pacheco, Bernadete Mello da Cruz, Beto São Pedro, Bruno Feiden Hass, Calino Pacheco Filho, Camila Padilha Costa, Camilo Marques Link, Carlinhos Hartlib, Carlos Alberto Kolecza, Carlos Castilho, Carlos Ramirez, Carlos Roberto Barth, Carmem Silvia Ramos Duarte, Carolina de Andrade, Carolina Kramm Garcia, Cassio Marques Linck, Cássio Mauss dos Santos, Cátia Cilene Duarte Garcia, Ceci Alencastro, Cecília Machado, Cecilia Nozari, Celia Barcelos, Celia Maria Leutchuk, Celina Martins Araújo, Celso Ohi, Cenair Maicá, Cezar Passarinho, Chico Martins, Chistian Marafigo Jasnievcs, Circe Rocha, Clair Boeira Garcia, Claoni Boeira Garcia, Claudio Bechler, Claudio Levitan, Claudio Meneguzzi, Claudio Silveira, Cleide Nizole Alves, Cleonice Fialho, Colmar Duarte, Colombo Cruz, Cristiano Heredia Garcia, Dalírio Gomes Alencastro, Daniel Stringhini, Danilo Lazarotto, Danilo Ucha, Darci Colombo, Darci Zanfeliz, Deise Garcia, Dejalma Correa, Delmindo Gritti, Denusa Franzen, Derli Cardoso, Dinarte Bellato, Dione Moreira Rodrigues, Dirson Azambuja Dias, Dolair Callai, Dulce Martins Matzenbacher, Dulce Matte, Duo Preto e Branco, Edi Oliveira, Edson Otto, Eduardo San Martín, Elena Blume, Elga Eleonora Graef, Elias Andrade, Eliezer Pacheco, Eloí Pereira, Elomar Figueira de Mello, Elvídia Zamim, Ênio Fontoura, Ênio Schwalm Graef, Enio Valdir Flores, Enon Cardoso, Ercília Ana Cazarin, Ereni Cazarin, Ernane Conter, Ernani Ranheri, Ervandil Moreira, Estevo Zaczeski, Eunice Costa, Eurico Veleda, Eva Regina Duarte Garcia, Evânia Reichert, Eveline Zysmann, Fausto Fotógrafo SP, Fernanda Ávila Hardt, Fernanda Marafigo Jasnievcs, Fernando Rovatti, Fioravanti Bastiani, Flavio Raab, Flavio René Mauss dos Santos, Francisco Martinez Torres, Francisco Weber Frantz, Frederico Füllgraf, Gabriel Simchem, Gabriela Gorziza Terres, Gaston Cesar, Gelson de Oliveira, Gilberto Amaro do Nascimento, Gilberto Bombardieri, Gilberto Carvalho, Gilberto Gil e Banda (Viena e Berlim 1979), Gilberto Monteiro, Gildar Meirelles, Glênio Fagundes, Gomercindo da Silva Pacheco (Guma), Gralha Azul (Curitiba), Grupo Engenho, Grupo Hinti Huasi, Grupo Las voces de Intihuasi, Grupo Marupiaras, Grupo Os Muuripás, Grupo Pentagrama, Guilherme Borges Hardt, Guilherme Weber Frantz, Héctor Alimonda, Hector Baronio, Heitor Correia, Helena Rodolphi, Henrique de Freitas Lima, Henrique Junior de Freitas Lima, Higino dos Santos, Hinti Marques Linck, Homero Aguiar, Hosana Ramos, Iara Fricke Matte, Iara Manoela Rodrigues, Ido Perez, Inácio Mahfuz, Inácio Panzani, Inezita Barroso, Iolanda Lobo Rodrigues, Irecê Gonçalves da Rosa, Irmãos Beltrão, Ivaldo Gehlen, Ivaldo Roque, Ivo Correia da Silva, Jader Moreci Teixeira, Jaime Barbosa, Jaime Caetano Braum, Jaime Callai, Jairo de Andrade, Jane Cardoso, Jane Zandonato, Jean Marie Farines, Jerônimo Jardim, Jerson Fontana, João Batista Duarte Garcia, João Carlos Bona Garcia, João Chagas Leite, João de Almeida Neto, João Voltaire da Fonseca, Joceli Leal Pereira, Joe Luis Martins Gonçalves, Jorge Alberto Gonçalves Jasnievcs, Jorge Baleeiro, Jorge Luis Ferreira, José Clovis Alencastro Fagundes, José de Abreu e atores de A Salamanca do Jarau (Angelica, Peninha e Vitor Hugo), José Fleck, Jose Guedes, Jose Hilario Retamozo, José Júlio Geiger, José Lutzenberger, José Machado Leal, Jose Ramos Tinhorão, Josete Siqueira, Joyce Ribeiro Nunes, Juarez Chagas, Juarez Fonseca, Júlio Forster de Freitas Lima, Júlio Geiger, Júlio Machado da Silva, Jussan Terra Prestes, Juvêncio Mazzaropi, Kayena Garcia da Silva, Keit Rodrigues, Kenelmo Alves, Larri Wisniewski, Laura Gorziza, Lauri Alencastro, Leani Ruschel, Leo Genisch, Leopoldo Racier, Ligia Simonian, Liliana Lavoratti, Lisandro Brum Motta, Loiva Araújo Moreira, Loiva Cunha Koller, Loma Pereira, Loreci Ramos Duarte, Lori Inez Feigel Grison, Lucia Helena Gama Ribeiro, Luciane Monza Koller, Luis Alberto Hebeche, Luis Arena, Luis Carlos Barbosa Lessa, Luis Carlos Golin, Luis Marcírio Machado, Luis Menezes, Luis Recena Grassi, Luis Rodrigues, Luiz Antonio Monza Koller, Luiz Brasil, Luiz Coronel, Luiz de Miranda, Maestro Guido Sereni, Maira Graeff, Mara Assis, Mara de Oliveira, Marcelo Melo, Marco Aurelio Vasconcelos, Marcos Vinícios Pacheco, Marcus Lopes, Marcus Pereira, Marcus Vinicius, Maria Aparecida Donda, Maria Araújo Mahfuz, Maria Bernadete Metz Bechler, Maria Clara Iribarrem Prestes, Maria Cunha Koller, Maria de Lourdes Lemos Moreira, Maria Edi Viegas Pereira, Maria Gueller, Maria Helena Schneider, Maria Inez Nozari, Maria Irtúria Vieira da Silva, Maria José Rebello, Maria José Silva, Maria Luísa Armando, Maria Pires Koller, Maria Wagner, Mariane Mauss dos Santos, Marilia Forster de Freitas Lima, Marilza Borges Hardt, Mario Barbará Dornelles, Mário Barros, Mario Gorziza, Mario Osório Marques, Maris Lorenzoni de Almeida, Maristela Marasca, Marlise Sauerssig, Martin Coplas, Martinho da Vila, Mercides Alencastro, Miguel Angel Aquilano, Miguel Luis Buchain, Modesto Silva, Moises Mendes, Nando Dávila, Nara Machado, Nara Righi, Nazi Terezinha Garcia da Silva, Nei Lisboa, Neita Ávila Bellato, Nelson Motta, Nelson Ribas, Nestor Monasterio, Newton D´arisbo, Ney Gastal, Nice Lena Henz, Nilson Violato, Nilza Boeira Garcia, Noé Carvalho, Noel Guarani, Noemia Rocha, Norci Araújo, Norton Correia, Novos Baianos, Odete Zadoná Schneider, Olga Romero, Olivio Vicentini, Oristela Alves, Os Angueras, Os Milongueiros, Os Teatinos, Os Três Xirus, Osmar Meletti, Osvil Lopes, Pablo Gonçalves da Rosa, Paola Gonçalves da Rosa, Paulinho Pires, Paulo Afonso Schneider, Paulo Afonso Zarth, Paulo Boeira Mizarek, Paulo Cesar Tiellet, Paulo de Tarso Carneiro, Paulo Denizar Fraga, Paulo Dorfman, Paulo Martins, Paulo Moacir Aguiar Vieira, Paulo Rudi Schneider, Paulo Sérgio Pinheiro, Pedro Araújo Mahfuz, Pedro Carvalho de Assis, Pedro Gilberto Lopes, Pedro Luis Lopes Osório, Pedro Tesch, Pentagrama, Pierre Mescoff, Pietra Gonçalves da Rosa, Quintal de Clorofila, Quinteto Violado, Rafael Ávila Hardt, Rafael Gorziza Vieira, Raimi Marques Linck, Raimundo Gonzales, Raul Elwanger, Regis Luhring, Renato Almendariz, Renato Janine Ribeiro, Renato Rocha, Reneu Geraldino Mertz, Ricardo Crespo, Rita Dionéia Riegel, Roberto Centeno, Rodrigo Graef, Roger Duprat, Ronaldo Ferreira, Rosane Mânica Cattani, Rovena Araújo Mahfuz, Ruben George Oliven, Rudá Marques Linck, Rudi Raab, Rui de Quadros Machado, Rui Goethe Falcão, Ruth Fricke, Sandro Ferreira, Sergio Pires, Sergio Pires, Silvio Luis Pereira da Silva Junior, Sírio Possenti, Sônia Monza Koller, Stella Maris Raimondo, Suimar Bressan, Tania Dias, Tania Luchese, Tania Pereira, Telmo de Lima Freitas, Telmo Uriarte, Tercila dos Santos, Tereza Ribeiro Boeira, Terra Viva, Texo Cabral, Thais Weigert, Thalys Garcia Junior, Tiaraju Carlos Gomes, Tiaraju Duarte Prestes, Tobias Gorziza Vieira, Toinho Alves, Turma do Dionísio, Ubiratã Carlos Gomes, Ulisses Santos, Vado Barcelos, Vagner Cunha, Valdir Graniel Kinn, Valmor Nini Beltrame, Valter Sobreiro Junior, Vera Leite Machado, Vera Skuratowsky, Vera Thielo, Viro Francisco Frantz, Vitor Duarte Prestes, Walkiria Iacocca, Walter Frantz, Wilarzi Martins, Wilson D`arisbo, Zé Camargo, Zé da Flauta, Zenar Eckert e Zuleica Ferreira. Pescadoras e Pescadores: Adão, Beti, Cau, Dico, Dina, Dona Adelaide, Dona Filinha, Dona Isaura, Dona Ledi, Dona Tereza, Evinha, Gaitero, Gibi, Gringo, Iara, Ivone, Janete, Jorge, Jussara, Levínia, Lúcio, Luis, Luis Antonio, Lulu, Marquinhos, Nara, Niquinho, Rosane, Rubinho, Seu Cesário, Seu Júlio, Seu Zé, Tereza, Tio Calo, Valdete, Valmur, Vilmar e Vornei.

Os Tapes, Obra e Andanças

Em nosso nome, de outras e com outras pessoas celebramos os milagres dos encontros e dos inícios, palavras e cantorias que latejaram em nossas veias e gargantas, ritmos e melodias que nossos ancestrais e musas das artes sopraram em nossos ouvidos e espíritos inquietos. Cultivamos o apreço à sabedoria e aos sentimentos morais espargidos por mulheres e homens nas sucessões dos tempos e nas vastidões do mundo, brindamos a vida em suas espessuras e devaneios desatados em lentos compassos de milongas e de lágrimas furtivas. Balançamos nos passos e abraços de valsas e dobrados e de habaneras faceiras. Afeiçoamos nossos ouvidos e corações aos versos e gargalhadas sem mordaças. Escavamos circunstâncias e significados nos quais nós e nossos protagonistas reais ou imaginários, nos movemos. Habitamos regaços de paisagens que nos acolheram, rastros de eventos e legados que, por milênios e séculos nos precederam. Em reminiscências, ditos e não ditos, sussurros, arroubos, macias, ásperas, hesitantes ou incisivas palavras vivemos!

1.

1971 – outubro/dezembro: início de Os Tapes

Começos demandam contextos, decisões, iniciativas e parcerias que os tornam possíveis

Primeira Califórnia da Canção Nativa e Vida, Cisma e Canto de um Farrapo.

Num entardecer de meados do segundo semestre de 1971, entre cuias de mate e conversas, no galpão situado nos fundos da casa de José Waldir Sousa Garcia, onde aconteciam audições musicais, literárias e debates sobre a vida e o mundo, fui convidado para uma iniciativa cujos desdobramentos provocaram o início de Os Tapes. Ao me passar um documento com informações e sobre a primeira edição da Califórnia da Canção Nativa6 a ser realizada em dezembro em Uruguaiana, Waldir, com voz pausada e solene anunciou: encontrei Leonardo em Porto Alegre hoje e ele não poupou palavras para elogiar uma iniciativa de um grupo de pessoas que assumiu a realização deste evento. Também me passou alguns folhetos para divulgar o evento aqui em Tapes. Isso dito, enquanto, rapidamente lia normas e orientações do folheto, Waldir, em um só folego falou: escreva algo, eu componho e nos inscrevemos neste festival. Entre informações do folheto, constava a de que doze finalistas seriam gravadas em um LP. Na época, Waldir cultivava seu gosto e talento para o canto e instrumentos de corda no Liceu Musical Palestrina. Tais habilidades, mais que regras do processo seletivo de Uruguaiana, me animou a lhe propor que criássemos uma obra mais curta que uma opereta e mais longa que uma faixa de disco vinil, constituída por récitas e cantos quais, um farrapo que participou da guerra, enuncia opiniões e crenças sobre o que acreditava viver bem no mundo. A pronta e surpreendente concordância do Waldir, implicava, salvo milagre, uma recusa de nossa inscrição. Por mais óbvia seria, para mim, a reposta vinda de Uruguaiana, o fato é que, meu sim ao Waldir, implicou para nós, escrever, compor e inscrever uma obra e, criar um grupo, em tempo que ninguém, de são juízo realizaria todos os percursos da tarefa. Inesperado nisso tudo, foi a velocidade com que tudo aconteceu e, em poucos dias, no galpão do Waldir, nascido de “pura imaginação” e, sob um pano de fundo raso de outros protagonistas, de razões e de fatos relevantes da guerra, um onipresente soldado farrapo, ocupa, todos os cenários da guerra, declama seus enunciados, devaneios, cismas e convicções acerca de si mesmo e dos acontecimentos e eventos e personagens da longa, contenda cívico-militar. De fatos e razões diz saber o que sabe e o que não sabe, espera poder saber, nos tempos que virão. De minha parte, que pouco sabia desta guerra, ative-me a escutá-lo amparado no aconchego de minha imaginação. Nada sabia de sua vida, antes, durante e depois da guerra senão o que ele expressa na sucinta e convicta exposição de motivos para encilhar cavalo, retirar-se do rancho que habita para e ele regressar após o acordo de paz. Em vibrante, ora murmurada récita , declama razões e sentimentos nos quais assentou a decisão de abdicar, ainda que provisoriamente, por “motivos sem conta”, de tudo que “constituía seu mundo”: família, vizinhos, alguns animais no campo, festejos e as danças de vez em quando. Mundo no qual, tudo lhe parecia estar bem e que, pelas falas espalhadas, ameaçava tudo o que sempre lhe parecera ser o melhor dos mundos. Que permaneça, pois, como sempre foi! Assim entedia, eram as coisas do mundo, desde tempos que suas lembranças alcançavam, que os olhos e ouvidos viam e ouviam na imensidão dos campos e coxilhas distantes das altas montanhas e extensos mares que apenas ouvira falar. Com poucas variações de palavras as quais se acrescem as que nomeiam novos lugares, protagonistas e acontecimentos da guerra, repete o que ouvira do pai que lhe precedeu na ocupação do rancho que agora o abrigava. Assim habitando minha imaginação este Farrapo me desobrigou de fatos, eventos e questões econômicas e políticas da guerra, a não ser aquelas que me narrou e que foram advindas das peculiaridades de seu código de ética e noção de Liberdade. 

Na amplidão da pampa sabe que, pode encilhar um cavalo e dispersar-se nas muitas direções das planícies ou seguir os rumos da convocação para a luta. Não é líder senão de convicções assentadas pela vida e contextos nos quais seus “pensares e crenças” se moldam e se adaptam a um mundo no qual convivem ou se embatem fatos e imaginários de relações escravagistas e de vagas, confusas ou, para poucos, relativamente esclarecidas concepções de liberdade. De seu matutar não emergem palavras e dizeres de um destacado proprietário, caudilho, ilustrado guerrilheiro, liberal ou de um viés republicano vindo de além-mar ou de outras distâncias para se aliar aos entreveros e bandeiras das lideranças farroupilhas. Não fala de intrigas ou divergências senão as espalhadas pelos comandantes e soldados afinados ou separados por diferentes interesses. Move-se em enunciados, pensamentos e perorações que expressam o peculiar código de honra pelo qual se orienta. Dentre eles: a honra vale mais que a vida; homem não é como gado que não sabe por que lavra, planta, luta e peleia.

Mais por disposição de decidir e menos por matutar sobre noções, para ele abstratas, tais como, opressão, povo, justiça e afins, se declara disposto a largar tudo o que “realmente” tem: família, afazeres, rancho, provavelmente assentado em um fundo de um latifúndio. Se pouco sabe de significados de democracia e de república, sabe muito de saudades, violência, traição, covardia e das razões que lhes apresentam para a luta e para aa paz. De bom grado, acata o que pensa ser a justeza da paz” sob mediação de Caxias e retorna feliz para o rancho. Com família, vizinhos reunidos, com alguns animais, aves e cães se movendo nas cercanias, a dança volta para São Pedro. Até que o não saber dos amanhãs que virão, descubram ou inventem outros anônimos para narrar suas cismas.Fatos e noções de liberdade que ecoam nas palavras deste Farrapo, não se distanciavam de crenças do imaginário de parte significativa da população e da literatura escolar e acadêmica que circulava à época. No meu caso, as lembranças de narrativas e testemunhos marcantes contendas regionais ou nacionais advinham da geração de avós acerca da Guerra do Paraguai e guerras civis da primeira metade do século XX. Nestas narrativas, sobretudo a respeito destas últimas, a geração dos avós sabia bem das diferenças entre protagonistas e figurantes jogados em turbilhões de violência desencadeados pelos conflitos de interesses. Nelas há indignação contra modos e métodos com que muitos jovens homens eram coagidos e jogados nas carnificinas das guerras civis. Enfim, escrita, em tempo recorde, as meditações do Farrapo ganham forma na recitação e composição musical coletiva de três dos fundadores do Grupo e autores de nossa primeira obra, Claudio Boeira Garcia (texto e música) Jose Claudio Leite Machado (música) e Waldir Souza Garcia (música e recitação). Na percussão nos acompanhou o músico tapense Ordelino Silva que participou das apresentações do Grupo até os últimos meses de 1972. Com duração aproximada de vinte e cinco minutos. Vida, Cisma e Canto de um Farrapo7, para nossa grata surpresa, na mesma noite de apresentação, no mesmo ato em que fomos agraciados com Distinção Especial pela Comissão Organização e Jurados do Festival recebemos o convite para apresentá-la na cerimônia de premiação e de encerramento da CCN no dia 19 de dezembro 1971.O acolhimento que a Comissão Organizadora e Jurados da primeira edição da California da Canção Nativa de Uruguaiana deram à inscrição de Vida, Cisma e Canto de Farrapo, cujo formato, obviamente, não se adequava às regras, mas, com certeza, ao espírito dos criadores do evento, foi celebrada, por nós e, de fato, inspirou as primeiras criações de nossa obra. Na noite de encerramento, das mãos de Paixão Cortes e ao lado Henrique de Freitas Lima, honoráveis e perenes amizades que nasceram nestes dias, recebemos uma Calhandra em cujo verso se lê: Prêmio Especial – Ao Conjunto Os Tapes – pelos novos rumos que abre no trato do tema nativo riograndense. 1ª Califórnia da Canção Nativa. Uruguaiana Dezembro de 1971. Ordem Dos Músicos, secção do RGS. Esta foi, de fato, a primeira obra de Os Tapes apresentada duas vezes, entre 08 e 19 de dezembro desse ano, na Primeira Edição da Califórnia da Canção Nativa e, também, no Anfiteatro de Paso de Los Libres na mesma época. Nestes dias, fomos também, com máxima gentileza, “premiados” com a preciosa edição de versos e poemas clássicos ilustrados por Arbio: Gaucho Ilustraciones de Arbio8  Oferta – Feria de Novedades – Paso de Los Libres: Republica Argentina – dezembro de 1971.9

6 Califórnia da Canção Nativa será abreviada, em várias ocorrências destas notas: por CCN
7 Vida cisma e Canto de um Farrapo, em várias ocorrências neste texto será abreviada por VCCF.
8 15 de abril de1967 – Talleres Gráficos “Arboleya” Rosario – Republica Argentina
9 VCCF se fez referência para formatos de alguns projetos musicais nos quais inscrevemos textos e recitações, entre eles: Americanto e Chão, Estrada, Canção .Evitamos regrar formatos de apresentações, temáticas, abordagens poético musicais, arranjos vocais e instrumentais, partilhamos sugestões, convergências e perspectivas alargadas de rastros literários, culturais, musicais regionais, sul-americanos e de outras proveniências.

2.

1972 – Canto Da Gente e II Califórnia da Canção Nativa

Nos primeiros dias de janeiro de 1972, animados pela convivência e recepção que tivemos em Uruguaiana e Paso de Los Libres, retomamos nossos encontros de fins de semana para o mate, conversas e ensaios. Nesses dias reafirmamos nosso estatuto de Grupo Amador disposto a conciliar demandas e atividades pessoais com as do grupo em dias e horários acordados para tal.10 Decidimos também, que, salvo exceções, nossos deslocamentos para apresentações seriam custeados por eventuais promotores. Logo após nosso retorno de Uruguaiana, acolhemos, com especial empenho, o convite de Paixão Cortes e da direção da Secção Regional da Ordem dos Músicos do Brasil, para apresentação de Vida Cisma e Canto de um Farrapo no auditório de sua sede na rua Vasco Alves. Aceitamos, também, o convite da Secretaria de Cultura de POA para uma temporada com 04 apresentações no mês de Julho no Teatro de Câmara. Temporada que, graças à recepção do público, foi ampliada para nove apresentações em agosto, setembro de 1972. 

Em início de 1972, já contando com a participação de Rafael Koller e do poeta e letrista Álvaro Barbosa Cardoso, além das citadas nos apresentamos em Tapes e vizinhanças, incluindo Porto Alegre e Lajeado, concentrados, sobretudo, em nosso segundo projeto Canto da Gente para a temporada no Teatro de Camara e que foi constituído por composições inéditas nossas, por obras de compositores uruguaios e Argentinos e por Vida Cisma e Canto um Farrapo inscrita no cento de Canto da Gente. Neste semestre, outra ocupação, não menos importante que CDG, foi nossa preparação das obras inscrevemos para a 2ª Califórnia. 

Preparamos O6 obras para o Encontro de Uruguaiana, para nossa surpresa, dessa vez quatro foram selecionadas para apresentação e três para a final. Mesmo assim, não nos passava pela cabeça quais seriam as escolhidas embora, tivéssemos nossas opiniões e preferências. Nossa tranquilidade e expectativa de que algumas músicas pudessem estar entre as escolhidas não era exceção, ela decorria do ambiente de celebração e de confraternização instaurado entre participantes e organizadores da primeira edição da Califórnia, nas quais, sobressaia a disposição de acolher, escutar e apreciar uma melodia, um poema, uma interpretação. Foi este espírito de apreço, escuta, gentileza e de inclusão que, antes de simplesmente desclassificar CCCF em 1971 pois que, regras para tal existiam – transformou o “fora da regra” em incluído sob outra perspectiva. Por isso voltamos, à Uruguaiana em seis edições para celebrar as artes e a confraternização lá estabelecida. Na primeira fomos como provocadores incluídos, na 2ª, 3ª e 4ª como participantes parceiros, na 5ª e 10ª como convidados. De todas nos ficaram marcas indeléveis nas amizades e sentimentos que mantivemos ao longo dos anos, com organizadores e músicos que participaram dessas jornadas memoráveis entre eles: Airton Pimentel, Aparicio Silva Rillo, Angueras, Cesar Passarinho, Edson Otto, Gilberto Carvalho, Henrique Freitas Lima e Marília Forster Freitas Lima, Ivaldo Roque, Knelmo Alves, Leonardo (Jader Moreci Teixeira), Jeronimo Jardim, Josete Siqueira, Leopoldo Rassier, Marco Aurelio Vasconcelos, Marupiáras, Loma, Iole, Paulinho Pires, Lucia Helena, Rosa Maria, Oscar e Mabel do Balllet de Brandsen, Oristela Alves, Paixão Cortes, Telmo de Lima Freitas e tantos outros. Participamos até a IV Califórnia como concorrentes, na V e XI como convidados. Experiências marcantes, em especial, a última, memorável apresentação para o público do acampamento. Fatos ocorridos na segunda edição da California, entre eles as premiações para Pedro Guará e outros destaques fortaleceram nossa convicção de que poderíamos continuar criando e atuando de forma a conciliar nossas atividades em Os Tapes com outras que desempenhávamos.

10 Nos primeiros anos de Os Tapes, Waldir e Acy, ambos no Liceu Palestrina e eu, Bacharel em Filosofia, cursava licenciatura em Ciências. Em escola pública, no interior de Tapes, Acy e Waldir ensinaram música e eu matemática, nessa escola, e em outras duas comunitárias localizadas na Serra do Erval. Anos importantes para futuros projetos do Grupo, pois que, a convivência com comunidades rurais da região, nos possibilitou imersões culturais, no sentido preciso destas palavras, em comunidades próximas ou da Serra do Erval, Dores de Camaquã e Emboaba (Tapes), Sertão Santana (Guaíba) e Barão do Triunfo (São Gerônimo). Tempo de informações de máxima relevância, para Não tá Morto Quem Peleia e Chão Estrada Canção.

3.

1973 – Primeiras Viagens vinculadas a California da Canção Nativa.

Durante o ano de 1973 – além de apresentações com músicos e Grupos participantes da CCN para o lançamento do Disco da 2ª Califórnia Em Porto Alegre, Carazinho, Santa Maria e Uruguaiana – inscrevemos três músicas na edição da 3ª CCN deste ano entre elas, Janaíta, registrada no Disco daquele ano. Por ocasião desse festival junto com o Ballet Brandsen atuamos no Anfiteatro de Paso de Los Libres. Concedemos entrevistas em canais de TV de Porto Alegre e do interior, participamos de Penhas do CTG 35. No segundo semestre de 1973, depois das apresentações para lançamento do Disco da segunda Califórnia e de dois anos de participação em Os Tapes, José Claudio Leite Machado que, desde sua primeira juventude, encontrou na música e no canto, a forma vibrante e iluminada de dizer o mundo, se afasta dos compromissos com os Tapes para cantar e encantar as pessoas encontradas nos percursos de sua existência.

4.

1974 – Festival de Cosquin

Na segunda quinzena de janeiro de 1974, estimulados por Martin Coplas, Dançarinos do Ballet Brandsen e por Henrique de Freitas Lima por quem fomos convidados para ilustrar a conferência que proferiu sobre música no RGS no Ateneu Folclórico, participamos no XV Festival Nacional de Folclore da cidade Argentina de Cosquin, província de Córdoba. Neste referencial evento para a Argentina, Uruguai, Paraguay e Países Andinos, tivemos a oportunidade de ouvir, no palco central, assim como, nas inúmeras penhas que ocorriam na cidade, compositores, intérpretes e grupos cujas obras admirávamos, fazia um bom tempo. Cantamos, também, nas ruas e penhas de Cosquin, convivemos com músicos, artesões, bailarinos e argentinos de várias províncias e, com justificável entusiasmo, retornamos animados com a ideia de iniciarmos em Tapes um evento no qual, um encontro musical, fosse articulador de um vibrante intercâmbio entre todas as formas de manifestações de arte da região litorânea e das serras do Erval e de Tapes. Em pequena escala, imaginávamos/projetávamos, replicando o espírito de Cosquin, animado por músicos consagrados de convocando iniciantes, artistas plásticos, artesões, cantorias populares, literatura, teatro, festejos tradicionais como o terno de reis, culinária local e regional. Sugerimos o início do mês de janeiro, como se os Ternos no Palco (Cantoria popular mais importante à época na região) estivessem cantando nas casas para as pessoas. Também, muitos livros dedicados às questões da memória e de iniciativas e desafios do presente. Em resumo: reunir músicos, artistas plásticos, poetas, dançarinos, artesões iniciantes ou reconhecidos dispostos ao congraçamento e celebração de distintas formas de artes. Com o afastamento de Luís Alberto, pouco tempo antes de nossa ida ao Festival de Cosquin, convidamos Vilimar Sasso Hardt para nos acompanhar, como amigo e percussionista. No segundo semestre deste ano Rafael Koller também se afastara para, em alguns momentos junto com José Claudio, outros com novas parcerias ou individualmente para consolidar suas extraordinárias e amplamente reconhecidas trajetórias de músicos nos cenários local e nacional de atuação e de recepção da música riograndense. Logo depois de nosso retorno, Alberi Gonçalves percussionista que atuava profissionalmente em Tapes, integra o Grupo e nele permanecerá, até meados de 1975.

5.

1974 – Centro de Arte Os Tapes – CEART.

No segundo semestre de 1974, em uníssono, eu, Waldir, Alberi, Acy e Jorge proferimos: vamos construir um teatrinho “quase de arena”. Nele atuarão cantoras e cantores, instrumentistas, contadores de estórias, poetas, declamadores, dançarinas e dançarinos. Nele ensaiaremos, discutiremos atividades, cursos de música, enfim será um espaço com finalidades, para nós de ensaio, recepção de amigos e visitantes e guarda de materiais do grupo. O dia oficial de compartilhar música e outras atividades culturais, designamos por Sexta Som e, semanalmente, em um pequeno palco, fazíamos um Ensaio Geral, antes disso, por aproximadamente uma hora ocorriam apresentações programadas ou espontâneas. Com fogão de lenha, capacidade de acomodar 110 pessoas, entrada franca ou contribuições voluntárias para o mate, carreteiro e, eventualmente, em algum dia de inverno, puchero, à época uns dos pratos mais tradicionais Tapes.11

11 De 1971 até 1974 nosso primeiro lugar de encontro era nos fundos da casa do Waldir, o CEART foi construído no espaço de uma oficina mecânica, localizada quase em frente deste galpão, e que em 1974 estava disponível para locação a qual foi renovada até o ano de 1978.

6.

1974 – Dezembro: última participação como concorrente na Califórnia Com Cheraçar Y Apacui12

Agradecidos e honrados pelo caloroso e fraternal acolhimento que sempre tivemos dos dirigentes, músicos e público nos despedimos da Califórnia da Canção Nativa de Uruguaiana. Evento notável, que não por acaso se fez referência regional, nacional e internacional sobre música criada no Sul do Brasil.

12 Cheraçar Y Apacui causou algum ruído à época por parte do público, mais por estranhamento, de algumas pessoas, ao nosso arranjo instrumental com guitarra elétrica e quena do que por outros motivos.

7.

1975 – Acampamento da Arte Gaúcha13 – (Tapes, janeiro 03-05).

Tudo começou, no ano de 1974, com a viagem a Cosquin. De nosso entusiasmo pelo que vimos, ouvimos e sentimos, neste icônico Festival, do impacto com a animação palpitante em todos os cantos de Cosquin, em especial à noite, sem hora para silenciar cantos e encantos do “Espírito de Cosquin”: confraternização, integração entre distintas formas das artes; literatura, música, teatro, dança, culinária, artesanato, cerâmica, entre outras. Voltamos para Tapes, entusiasmados para compartilhar a disposição de criarmos um evento que acolhesse manifestações de arte/cultura popular, ainda fortemente enraizadas na região e, ao mesmo tempo, estimular apresentações musicais das novas gerações, músicos amadores, ou consagrados. Iniciamos o debate com nossos sábios conselheiros para assuntos públicos de boa parte de nossa geração, entre eles, Gaston Cesar, Diretor da Rádio Tapense e Rui de Quadros Machado, também, com parceiros de nossa geração, ou um pouco mais velhos, dos quais tínhamos em conta, notórias disponibilidades para o voluntariado, assim como expertise em áreas fundamentais para viabilizar o projeto. Grupo ampliado, animado e esclarecido sobre e condições demandadas o que incluía sugestões de nomes de voluntários e demandas para a execução do projeto, solicitamos uma audiência com titulares dos lugares do Poder Executivo e Legislativo municipal, ocupados à época por Paulo e Antônio Simchem, os quais, com satisfação, agradecimento e apoio à iniciativa, prontamente encaminharam os processos institucionais de aprovar e oficializar o Evento. 

Tão logo estabelecida a equipe organizadora que incluía funcionários públicos, secretários e expressivo grupo de colaboradores, entre eles o empresário Jaime Barbosa, construção do palco, Gaston Cesar, Diretor da Radio Tapense, Gildar Meirelles, Segurança, Cleide iluminação, Beto Lopes Barracas do exército e banheiros ecológicos, Rui de Quadros Machado, Troféu Tio Lautério e Artesanato, Kalata Alimentação, Rui Machado e Silvio Rebello artesanato, Waldir e Claudio, Estatuto, Direção técnica e artística do acampamento.

A noção mesma, de Acampamento, já sugeria a ideia de um encontro no qual, parte significativa dos participantes poderia acampar à sombra das árvores próximas da Lagoa. Difícil descrever as cenas e o contentamento daqueles que participaram deste primeiro evento e o espírito que congraçou todos os presentes. Felizmente se confirmaram as expectativas de que o evento poderia surpreender em termos da divulgação estadual e nacional e, sobretudo, do público que nele compareceu. O evento nos marcou, pelo estreitamento de laços entre o Grupo e lideranças políticas e culturais de Tapes, também, pelo impacto que teve, nos anos seguintes, com a invasão turística na cidade procurando espaços para acampar nos fins de semana e nas férias. Muito disso se deve a extraordinária cobertura jornalística e televisiva feita sobre Tapes, Os Tapes e o Acampamento nos dias que o precederam e a ele se sucederam. Bem mais que de recursos humanos e materiais à disposição, o evento nasceu da solidariedade e entusiasmo de expressivo grupo de pessoas que apostou que, as condições de uma festa para celebrar a arte, nos termos em foi concebida, fazia um bom tempo, já estavam dadas.

13 1º Acampamentos da arte Gaúcha será abreviado em todas as ocorrências por 1º AAG.

8.

1975 – Novos Integrantes, Novos Projetos: Tuio, Betinho, Darci, Zezé, Reni, Silvio.

Talvez os anos de 1974 e 1975 tenham sido os anos mais intensos de atividades, reuniões e ensaios do Grupo Os Tapes. Esta observação recente de Otacílio, observador de nossas atividades na Garagem onde inauguraríamos o CEART em 1974, eram verdadeiras e repercutiam iniciativas anteriores, outras que estavam em andamento e novas em execução. No início de 1974 fomos à Cosquin; no segundo semestre, construíamos o CEART; ao mesmo tempo estávamos empenhados na preparação do 1º Acampamento da Arte Gaúcha; ensaiando Cheraçar Y Apacui para a California; envolvidos na acolhida de um novo integrante, no caso, Betinho que assumiria a percussão e já em conversações com o Darci que entra no grupo no início de 1975, quase junto com Tuio, Zezé, Reni e Silvio que já fazia um bom tempo nos assessorava com as questões de som. Entre os seis novos integrantes deste período, quatro, não ultrapassavam a idade de vinte anos. Com muita gana de ensaiar, cantar e tocar seus instrumentos, nos quais já eram, exímios, criativos e experientes percussionistas já que, desde suas “tenras infâncias” integravam baterias de escolas de samba e blocos carnavalescos da cidade. Também, no caso do Darci, multi-instrumentista que, para satisfazer o pai que ansiava, para deleite particular, ter em casa, um exímio gaiteiro, o que em parte, não coincidia com o desejo juvenil do filho que ambicionava ser um craque de futebol. Respeitoso, como sempre foi, ao perceber o som do carro de seu pai chegando em casa, corria para a cadeira empunhando a gaita de qualquer jeito. Assim, quem já nasceu bom de gaita, apareceu, em Tapes e para todos os que admiram suas artes, um gaiteiro que, sem ser canhoto, toca gaita em posição invertida. Ainda bem que seu pai nem nós o obrigamos a sair pelo mundo a tocar seus instrumentos e exibir seus talentos vocais instrumentais preciosos. Era o único que saia do grupo dependendo do estado de humor. Sentíamos saudades nestas ocasiões e celebrávamos quando retornava. Por sua vez, desde a entrada de Silvio e Reni, sentimos a segurança de ter quem cuidar de nossas vidas, no caso, de nosso próprio som, e da organização de nossas viagens.

9.

1975 – Carolina de Andrade no CEART.

Em 19 de maio de 1975 no CEART, depois do SEXTA SOM, ocorreu o primeiro encontro de Carolina Andrade e Os Tapes. Desde as primeiras palavras, que se prolongaram como se por dias, meses e anos, já estivéssemos mutuamente encantados por nossos projetos. Encontro por acaso, como soube por ela nesta noite. Acaso porque, era uma sexta feira e neste dia haveria, porque não estávamos viajando uma edição do Sexta Som e um ensaio geral. Acaso e não acaso porque, em um entardecer de sexta feira, Carolina se hospedou com Paixão Cortes, em um Hotel no centro da pequena Tapes. Seu objetivo era, em nome da Marcus Pereira, observar cantorias de ternos de Reis na Região, assim como outras manifestações para compor a série de quatro LPS da Coleção: Música Popular da Região Sul, da Marcus Pereira. Acaso e não acaso porque, costumávamos, expor nos lugares de maior frequência pública, um pequeno cartaz que avisava datas em que haveria o Sexta Som. Carolina, curiosa igual paulistas ávidos por informações e descobertas sobre o que acontece em São Paulo e nos lugares para onde viajam, leu no cartaz: Hoje, 19 de maio de 1975 no CEART, tem SEXTA SOM. Em algum momento a Carolina me passou para Marcos, emocionados como já fôssemos, de toda a vida amigos que partilhavam, mais acordos do que divergências, logo depois tivemos em Tapes um encontro que definiria nossa ligação sem igual Tapes e Marcus Pereira. Neste ano, depois da vinda de Marcos com Carolina para Tapes entramos em atividade intensa de preparação, primeiro para gravação de nossa participação na Coleção Música Popular do Sul e, logo depois de Canto da Gente. Preparação de Americanto e apresentação em Santa Rosa e no Teatro de Câmara. No inverno desse ano, viagem SP para gravação. Música Popular do Sul e Canto da Gente.

10.

1975 – Americanto.

Convidados, com quase um ano de antecedência para uma apresentação durante o I Simpósio Nacional de Estudos Missioneiros a realizar-se na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras Dom Bosco de Santa Rosa RS entre os dias 22-26 de outubro de 1975, prometemos criar um projeto específico para este evento. Desde nossa apresentação em 1972 na California da Canção Nativa em Uruguaiana, evidenciamos que os povos originários, as levas de escravos africanos entre os séculos XVI e XIX e, também as mais recentes nas quais chegaram imigrantes europeus e de outras procedências no RGS durante o século XIX, estariam presentes em nossas abordagens musicais. Americanto em seus textos e cantos, nasce, antes de tudo, de uma disposição para compreender e preservar na memória um evento de imensa repercussão local e mundial no século XVIII. Nasce, sobretudo, da perplexidade e da compaixão para com os sofrimentos brutais impostos aos povos originários e seus descendentes. Também da indignação contra as tentativas de quebrar e de apagar os sinais de violência e de resistência de povos originários. Além de Santa Rosa, o projeto Americanto foi apresentado em outras cidades da Região Missioneira e em temporada no Teatro de Camara de Porto Alegre.

11.

1975 – Carolina de Andrade e Marcus Pereira em Tapes:

Apresentação no Clube Aliança e entrevista de Marcus na Rádio Tapense. (outubro de 1975). Nestas ocasiões, amigos e conhecidos de Tapes puderam ver, ouvir, conversar e confraternizar com pessoas que empenharam parte significativa de suas vidas à memória de várias e seculares redes de interrelações sociais e com pessoas que estão na origem e nos desdobramentos aquilo que um dia foi designado por Música Popular Brasileira. Em Tapes, “em casa”, à vontade, compartilhamos o indelével prazer de estar juntos, de enunciar convicções, projetos e afetos que ainda latejam em nós que tivemos a sorte e a felicidade de, com Carolina e Marcos, conviver. Dádivas que apenas as deusas da amizade propiciam! Carolina e Marcos, nossa eterna admiração e Carinho!

12.

1975/1976 – Canto da Gente II e Temas de América Andina e Pampeana.

As condições para a realização desse projeto estavam dadas antes do nascimento de Os Tapes. Na primeira parte descrições acerca da serenidade, temores, indagações e demandas da condição humana e da vida social em seus abismos e aparências. No essencial: devaneios sem lugar nem destino ou em andanças por cenários e cenas nas quais estivemos inscritos, desde nossos nascimentos, em nossa pequena Vila de Tapes. A leste, nosso mar de dentro, a Lagoa dos Patos, a oeste, em três planos, uma nesga da planície costeira, coxilhas e, sob céu, ora turvo às vezes límpido, cumes de cerros da Serra do Erval entre Camaquã e Emboaba. Nelas. o trabalho, atividades cotidianas, crenças, anseios e sentimentos experimentados que se atravessam nas toadas e recitações que nos fizeram regressar a nós mesmos. Beira d`água, em meios aos pedidos de casamento, sacolas escolares, peixes, benzeduras, caminhadas e descidas dos cerros a vida corre e escorre deixando seus rastros sob forma de versos e recitações que nada mais dispõem e necessitam, senão melodias e palavras que crescem livres para que a vida navegue e caminhe nos tons e sons da memória do que aconteceu e continuou disponível para ser lembrado. A segunda parte: Temas de América andina e Pampeana, encontra, entre outros antecedentes, as mateadas no Galpão do meu primo Waldir de Souza Garcia, um dos fundadores de Os Tapes. Galpão que, por mais de dois anos (1971-1973) sediou as reuniões e ensaios do Grupo. Nele, alguns anos antes, ouvíamos – a cada retorno de minhas viagens de férias ao Uruguai e Argentina na segunda metade da década de sessenta – discos dos compositores e intérpretes referenciais do Uruguai, Argentina, Paraguay, Bolívia, Chile e Peru. Depois, com os Tapes em atividade, alguns fatos e outros acasos foram decisivos à segunda parte deste projeto que designamos por Temas de América Andina e Pampeana. No Canto da Gente de 1972 já tínhamos acolhido várias composições do cancioneiro destes países, depois disso, nossa viagem a Cosquin em 1974, mais a estadia alongada de Martin Coplas em Tapes em 1974 e, alguns meses depois, por recomendação sua, em julho de 1975, recebemos a visita do Jovem Casal de músicos de La Plata, Stella Maris Raymondo e Miguel Angel Aquilano. que passou por Tapes para nos conhecer. Essa casual e feliz visita, nos ofereceu a oportunidade de convidá-los para permanecerem um período em Tapes para os Arranjos e montagem da segunda parte. Tudo se passou como se, tivéssemos, desde sempre, combinado esse afetuoso e profícuo encontro a partir do qual atuaríamos juntos para viabilizar Temas de América Andina e Pampeana.

13.

1977/1978 – Não tá morto quem peleia.

Como descrever o impacto que este Projeto exerceu sobre nós mesmos assim como nas pessoas com as quais convivemos, entrevistamos e gravamos nas fases de sua realização14 Impacto evidenciado, também, na reação dos espectadores e críticos musicais que assistiram as noves sessões de sua primeira apresentação no Teatro de Câmara em Porto Alegre. Desde a primeira fase do projeto, nossos ouvidos, olhares e sentimentos se engastavam nas palavras, sons e imagens e relatos daquelas pessoas que carregavam, latejantes em suas mentes, corpos e vozes, experiências que viveram e ainda viviam. Relatos sob formas de melodias, ritmos versos, cantos e causos. De início sinais de surpresa e emoção que se transmutavam em satisfação, por perceberem, nossa genuína paciência e pulsante interesse, nossa inquieta disposição de escutá-los e ouvi-los por horas e mais horas, por dias e noites, suas palavras vozes e, em algumas ocasiões, instrumentos que já não mais dispunham e que providenciámos para que por dias, semanas, ou meses recordassem de seus tempos de cantorias. Por meses. eu, Waldir, Acy, Silvio e outros participantes do Grupo, no auditório do CEART, nas planuras costeiras de Tapes ou nos estreitos caminhos da Serra do Erval ouvimos, conversamos e fotografamos por quase um ano os protagonistas deste projeto. Parte significativa destes anos de contato com o passado que não passou, no que se refere aos aspectos musicais, foi posteriormente registrada no nosso Álbum Não tá morto quem Peleia da Marcus Pereira.

14 No rigor da palavra, não fomos pesquisadores, nem descuidamos procedimentos éticos nas atividades de escutar e registrar depoimentos de entrevistados, ocorridos, em especial, em Não tá morto quem peleia. Mais que créditos, admiração e respeito às pessoas, com elas misturamos vozes, palavras, cantos e causos que ainda latejam em nossos sentimentos e nas interpretações que realizamos à época.

14.

1978/1979 – Chão Estrada Canção.

Entre os anos de 1972 e 1978 Acy, Waldir atuaram, por algum tempo, no ensino de música no Emboaba, eu durante seis anos, no ensino de matemática em escolas comunitárias do meio rural. Além da Escola Rui Ramos, nas encostas do Cerro do Emboaba – antigo distrito de Tapes hoje de Sertão Santana. Nesta época atuei em outras duas escolas comunitárias situadas nos bucólicos povoados de Sertão Santana e Barão do Triunfo – hoje sedes dos municípios com os mesmos nomes. Nestes locais encravados ou próximos da Serra do Erval, o convívio com os moradores, pequenos proprietários e seus filhos, muitos deles frequentando estas escolas pioneiras de ensino médio, com idade acima de crianças de centros urbanos, permitia acompanhar os movimentos e efeitos reais e não raro dramáticos do êxodo rural. Fenômeno mundial que se efetivou e se efetiva, ainda sob modos e formas distintas em diversa regiões do planeta. Na época em que o tematizamos, a literatura cientifica, institutos de pesquisas governamentais mundiais e comunicadores atentos de mídias locais não ignoravam a magnitude e consequências dos deslocamentos migratórios expressivos nestes anos. Para muitos tapenses, devido a relativa proximidade de Porto Alegre que se encurtara mais com a inauguração da Ponte do Guaíba em 1959 e, sobretudo, ao fato de que, cada ano, centenas de adultos, jovens e crianças migravam para uma das Cidades da Região Metropolitana, havia contato constante com a capital e com cidades próximas dos rios Guaíba, Gravataí, Sinos e região de Viamão. Assim que era possível acompanhar, visualmente, o aumento populacional constante e notório das populações de Porto Alegre e cidades vizinhas. O designado, êxodo rural, se oferecia às nossas considerações e sentimentos pelos impactos que produzia em nossas vidas e nas das famílias e pessoas que conhecíamos e convivíamos na região. Bastava nascer nas pequenas cidades ou vilarejos próximos a Porto Alegre e da região metropolitana para saber quanto as periferias cresciam de forma desmesurada e desordenada nos alagados e subidas dos morros. Na segunda metade da década de 1950, enquanto concluía meus estudos do Ginásio, tínhamos aguçado nossas faculdades intelectivas e sentimentos morais para lidar com este fato visivelmente acelerado como um carro veloz que parecia descontrolado em direção aos banhados e charcos e subindo os morros e descendo ladeiras de toda a região. Pouco depois, na primeira década de existência de Os Tapes, temas afins às redes de relações e de lugares ou não lugares sociais que o êxodo acentua, aparecem em algumas de nossas composições entre elas: Gurisito, Peão Velho e Janaíta, às quais se integrarão em Chão Estrada Canção, Menino de Sacola, João da Ponte, Noite Tirana, Um Doutor, Campesino e o verso popular Cante e Dance e os quatro textos que integram este projeto Musical. Não por acaso, nossas doloridas melodias e arranjos vocais meditam e expõem as dores do processo cuja velocidade e estridência e ímpeto parecia não dar tempo para reações e controle sobre as perplexidades e impactos registrados na vida de milhões de pessoas. Ao ouvir, mais de quarenta anos depois – relatos poéticos e sonoros de nossa experiência de lidar com esta corrida às áreas urbanas de cidades, nas quais, as luzes de lâmpadas estavam disponíveis durante as 24 horas do dia – reiteramos: as luzes da razão, de protagonistas, observadores e narradores de façanhas e tragédias, não foram capazes de prever, enfrentar e conduzir, em termos razoáveis, o que humanos desencadearam, em suas causas e efeitos.15

15 Este Projeto foi inspirado por textos que eu e Luiz Carlos Golin redigimos em acampamento, com familiares e amigos, no início de 1978, no interior de Barão do Triunfo. Nesta ocasião, me despedia, do Emboaba, Sertão Santana e Barão do Triunfo, região na qual atuei, como professor de matemática, durante 06 anos, para iniciar carreira de docente na Faculdade de Filosofia e Letras de Ijui e, também, para atuar em um Projeto da Unijui/Cotrijui em apoio à formação de professores de escolas unidocentes da região.

15.

1979 – Retrospectiva I – Cantos e Andanças.

Apresentamos nossas obras nos formatos de oito Projetos Musicais e de duas Retrospectivas. Em ambos os casos, as apresentações, salvo exceções, se constituíam por criações nossas, de outros autores ou de domínio público. Criação e Apresentação, desde o início, cruzaram fronteiras entre línguas, melodias, palavras e ritmos moldados em passados que não passaram e em presenças que ainda são/estão. Projetos: Vida Cisma e Canto de um Farrapo 1971; Canto da Gente 1972; Americanto 1975; Canto da Gente 2 & Temas de América Andina e Pampeana (1975/1976); Não tá morto quem Peleia (1977); Chão Estrada Canção (1978); Folia de Reis, 1982; Estações das Águas (1971-2003). Ao completarmos oito anos de atividades no segundo semestre de 1979, iniciamos a primeira retrospectiva designada por Cantos e Andanças. que se prolongou até 1980. E foi. apresentada, com algumas exceções, em Porto Alegre e região metropolitana.

16.

Horizonte 79 1 Festival der Weltkulturen Berlin 21. juni 15, juli 1979.

Oportunidade ímpar de convivência com músicos brasileiros cujas trajetórias acompanhamos, desde o início de suas carreiras, casos de Gilberto Gil e Banda e do Grupo de Pernambuco, Quinteto Violado. Nossa afinidade com alguns temas do Quinteto era tanta, que incluímos em nossas apresentações A Marcha Nativa dos Índios Quiriri. Com ambos os Grupos partilhamos várias apresentações em Berlin e uma na Áustria (Viena). Além disso, participar neste Festival, nos ofereceu a extraordinária oportunidade de, durante duas semanas, ver, ouvir e conviver com grupos e músicos de Nações da África e do Caribe e com variada e referencial mostra de formas de arte realizada durante as duas semanas do 1 Festival der Weltkulturen Berlin 21, entre elas, mostra de cinema, de teatro, de literatura e de artes plásticas.

17.

1982 – Festa de Reis (1982).

Na região de Tapes, com a expressiva chegada de nossos ancestrais dos açores no século XVIII, chegaram as Cantorias de Reis. Variações melodias, de entonação e formação dos grupos à parte, ninguém perguntava de onde provinha o costume de cada final de ano, renovar e esticar os coros dos tambores, reservar um tempo de ensaios com mestres, cantores e instrumentistas das vizinhanças ou até de mais distâncias, para repassar versos e vozes dos Ternos de Reis. Tempo de preparo, entre outros, dos obrigatórios doces do Natal, entre os quais se destacavam doces de figo e abóbora em calda. Entre 26 de janeiro até o dia 06 de fevereiro apareceriam para cantar e festejar o nascimento de Cristo e a visita dos reis do Oriente. O Mestre era quem puxava a cantoria, que aqui em Tapes, se perfazia por versos repetidos em terça por um duo em geral encarregados do pandeiro e do estribo. Tapenses de minha geração cujas famílias cultuavam a tradição do Terno De Reis, em cuidada etiqueta, o Mestre que tocava Gaita ponto e dirigia a cantoria, retinha na memória ou na capacidade de improvisar tantos versos quantos necessários, até que a gentileza ou judiação dos donos da casa atendessem os pedidos de Porta Aberta. Em geral, em casos de Ternos prestigiados por virtudes musicais, a “judiação” era prolongada até que cantassem o infalível verso, com apelos às donas da casa, que impedisse a retirada caso a porta não fosse aberta. Em nossas infâncias em Tapes nas décadas 40 e 50 e 60 ainda era tão seguro que vários Ternos cantariam nestas datas como era fato que depois da noite, amanhecia. Em nossa Folia de Reis, no Teatro de Camara, nos inícios dos anos 80, com a primeira parte com iluminação quase zero, simulando a falsa escuridão das casas, nos postamos no palco, como se estivéssemos no terreiro e a casa com luzes apagadas o auditório. Uma vez encerrada a cantoria na plateia iluminada, cantando e dançando músicos e plateia celebrando alegrias que a vida e encontros propiciam. 

18.

1982 Gravação do Álbum Os Tapes com a Cantares de Martin Coplas.

Álbum que reúne obras de dois projetos do Grupo e que, em boa medida antecipa o último, quais sejam: Chão estrada Canção, temas de América Andina e Pampeana e Estações das Águas.

19.

1982/1984 – Retrospectiva II.

Ao completarmos dez anos em 1982 nos preparamos em uma Segunda Retrospectiva para nos apresentarmos (1982-1984) em várias localidades dos três Estados do sul do Brasil na maioria delas, sobretudo as mais distantes, nos apresentamos por primeira vez. A Retrospectiva II (1982-1984) foi constituída por repertório consolidado a partir de nossas composições inscritas nas quatro primeiras edições das CCN em Uruguaiana e advindas de projetos posteriores ao VCCF realizados de 1972 até 1982. Seu período intenso de apresentações ocorreu entre 1982 e 1984 e se estende por várias regiões dos Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. Os integrantes de Os Tapes que atuaram com intensidade atípica para O Grupo nestes dois anos se organizaram de tal modo que pudessem dispor de condições para viagens além de fins de semana e, também, para constantes retornos para Tapes. Assim como na primeira Retrospectiva os Programas das apresentações listavam entre 18 e 21 composições de nossa autoria, de outros autores e de domínio público.

20.

1982/2003 – Estações das Águas: origens e percursos.

Estação das Águas em sua criação, elaboração, apresentação e registro em CD, ultrapassou o tempo de existência formal de Os Tapes (outubro 1971 – dezembro de 1988). O projeto acolhe temas da Lagoa dos Patos e de seu entorno, os quais habitaram a imaginação literária e musical do Grupo desde as primeiras obras: Barqueiro (Canto da Gente 1972, Teatro de Camara ), Entre o Mar e Pampa há uma Lagoa (2ª Califórnia) e Dança da Lagoa do Sol (1974). Na segunda metade da retrospectiva2 (1982-1984), quando o ânimo das andanças arrefecia e o entusiasmo pela atividade de criação renascia16 estimulada por reuniões de pesquisadores, cineastas e artistas reunidos em Tapes, em fins dos anos 70 e início dos oitenta, vislumbramos iniciativas centradas em lazer, turismo, educação e preservação ambiental, documentários áudio visuais, artes plásticas, artesanato, literatura, teatro e história, envolvendo municípios da Costa Doce. Época de somar esforços em favor de urgências ambientais; de mobilizações municipais ocorridas na Costa Doce em favor de tratamento de dejetos de papeleiras e de objeções às propostas debatidas no Polo Industrial de Charqueadas, as quais, se não contidas, afetariam, severamente a Lagoa e seu entorno. Não aprovados os custos do projeto abrangente, seguimos nossa trajetória, no âmbito musical e no formato e nas condições que mantiveram Os Tapes em seus 17 anos de existência. Entre os anos 1979-1983, Airton, Claudio, Ronaldo e Otacílio, versejam, cantarolam e criam melodias, para novas composições entre elas: Perguntas, Versos de Itapuã à São José, Zamba sem Porto, Sussurros, Felicia, Bailarinos D`águas e Ventos, Olegário e Olho Gateado. A integração de número expressivo de obras desta época, algumas registradas no Álbum Os Tapes da Cantares (1982), outras, em apresentações da Retrospectiva2, indicam o vigor da retomada do tema por compositores e intérpretes do Grupo do período ( 1979-1984) que, em parte, coincidiu com a Retrospectiva2 da qual participaram: Airton, Claudio, Darci, Jorge, Pedrinho , Otacílio, Ronaldo e Zezé. Composições que ofereceram o estímulo inicial ao projeto homérico que, por mais de 20 anos, em paciente, longa e profícua atividade, Airton e Otacílio17, apoiados pelo entusiasmado artista plástico e navegador Silvio Rebello e, eventualmente por mim, bem mais que escavar o acervo musical e literário disponível registrado e inédito sobre o tema, criam composições que passarão a ser referenciais sobre o tema, entre elas Arroio Lindo; Pé, Popa, Ponta, Proa; Dança no Terreiro; Sinais. Mais de vinte apresentações, com formações distintas são realizadas entre elas a de Airton & Otacílio em 1990 no Teatro Coliseu em Camaquã; 1994, no Teatro Sete de Setembro em Pelotas; E no Auditório da Reitoria da Unijui em 2002. Resumo: Os movimentos principais desse projeto coordenado por Airton, Otacílio e apoiado por Silvio Rebello (1989 – 2003) Nasce inspirado em obras da primeira fase de os Tapes, nas criadas ou arranjadas por Airton, Claudio, Otacílio e Ronaldo em fins da década de 70 e inícios dos anos oitenta (1979-1984). Momento emblemático da disposição de conceber Estações das Águas como último projeto de Os Tapes ocorreu por ocasião de sua apresentação em 2002 em data comemorativa da UNIJUI no Auditório da Reitoria. Grande parte do público desta apresentação, conhecia, de longa data, conhecia a obra e cada integrante de Os Tapes que em várias ocasiões se apresentaram em pelo menos 05 dos principais palcos da cidade. Mesmo assim, como de costume, escrevi curto e detalhado texto, sobre o tema, autores, músicos presentes, etc. Nos bastidores, em conversas e ao passar o texto para meu amigo apresentador, antes de depois de lhe passar o texto, insisti no cuidado para a leitura na integra do sucinto texto, que entre outras notícias, informava que, nessa noite, no palco estariam cinco músicos que foram integrantes de Os Tapes, todos bem conhecidos da plateia, mais ainda eu que à época completava 24 anos de docência na Instituição. O público sabia desses fatos, como sabia que o Grupo encerrara atividades em 1978, que filhos de Airton, o meu, que Paulo Schneider e seu Filho Matheus estavam no palco. Também, ouviu, com máxima atenção, a detalhada descrição das pessoas e do Programa da apresentação lida pelo prestigiado locutor da Rádio da Universidade e Mestre de Cerimônias do Evento. Mestre que, ao encerrar a leitura e, pausadamente, estender braços e mãos, em espacial aquela que segurava as anotações lidas, com igual lentidão e elegância, estufou o peito e fez ecoar, com aveludada e retumbante voz, no amplo e silente salão do auditório: Estimado público! Com vocês Os Tapes!

16 Da retomada de temas da Lagoa, em tempos da Retrospectiva2, advêm obras registradas no álbum, Os Tapes da Gravadora Cantares em 1972. Escritos e esboços deste tempo, são retomados e integradas, décadas depois, em Estações das Águas – Projeto concebido e realizado após o encerramento das atividades do Grupo em 1988 e que, em sentido lato e estrito da expressão, carrega o Geist da obra de Os Tapes, pois que, acolhe composições de todos os períodos de sua existência e, foi apresentada por dois ou mais intérpretes de suas diferentes formações.
17 Desde os anos 70, Ercília e eu tivemos moradia na beira da Sanga da Charqueada, vizinhanças da Vila dos Pescadores no Balneáreo Rebello. Foi a última “morada” de Os Tapes. Lá, Otacílio permaneceu entre os anos 1986-1996 e, com Airton e Silvio Rebelo, entre os anos de 1986-1990, escavaram obras compostas ou inacabadas até o ano 1984 e criaram as obras referenciais do repertório de Estações das Águas.

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Anotações afins: Os Tapes, Obra, Andanças

Arte e pautas republicanas, anos 70 e 80

Repúblicas Democráticas Constitucionais são estabelecidas em um círculo virtuoso que dá vida a um corpo político assegurado por uma Constituição que define e articula os conceitos axiais: igualdade, liberdade, consentimento, lei, direitos, dissenso, tolerância, acordo, voto, governo, participação, representação, poder, divisão de poderes, república, democracia, cidadão, esfera pública, privada, constituinte e constituição. Eventos que criaram em fins do século XVIII, repúblicas constitucionais, inspiradas nas tradições filosófico- Jurídicas do Iluminismo e do Contrato Social, ainda que, com extensão encurtada da cidadania real, nela assentam a autoria e a decisão dos direitos e deveres escriturados na Constituição. Nos percursos reais da democracia, a desobediência civil, exercidas publicamente por parcelas da cidadania em favor da universalidade de direitos enunciados, faz tempo, assim como de novos demandados, tem contribuído e terá que contribuir para superar os déficits reais e constitucionais. Democracias Vigorosas sobrevivem nas demandas políticas que as aperfeiçoam e renovam o espírito de suas leis. Nelas, os distintos estatutos da atividade política e artística, se afinam na dependência que ambas têm da partilha a condição de que ambas dependem de “esferas públicas” para serem vistas, escutadas, aplaudidas, debatidas, criticadas e celebradas. Diferentes, são as condições destas atividades sob Governos totalitários, ditatoriais e afins. O que isso tem a ver com atividade artística de Os Tapes. Muito! Democracias bem constituídas não acatam ações desmedidas de indivíduos ou grupos que visem, sob qualquer pretexto, suspender o Estado Democrático de Direito. À vontade particular de pequeno ou grande grupo, não é concedido o direito de alterar a constituição sem processo legal constituinte. Fundadores do grupo, nascemos e vivemos nossa juventude sob o impacto das tragédias políticas e morais produzidas durante e depois da 2ª Guerra Mundial; época de governos totalitários, colonialistas, ditatoriais e, alguns, com anseios democráticos. Tempos de guerra fria, de ameaças de uso de armas nucleares, de divisão do mundo em blocos, antes interessados em propagandear pretensas virtudes políticas e econômicas de seus regimes do que estender genuínas práticas republicanas e democráticas a totalidade das populações de seus territórios. Época de apagamento das tradições racionalistas, humanistas, iluministas, libertárias, sociais democráticas, de protestos contra seculares déficits das democracias europeias e americanas. De esquecimento do princípio crucial que estabelece e sustenta uma sociedade democrática: o Povo (em sua totalidade e ação instituinte) é Fonte do Poder Político e da Constituição. A Constituição é Fonte das Leis. No Estado Democrático de Direito, quem ocupa, provisoriamente, lugares da República, a serve para estender e garantir as vantagens da Lei à totalidade dos cidadãos, também, para coibir ações desmedidas que expõem à risco o Contrato que a Instaurou. Liberdade de opinião, de organização política, de crença religiosa, universidades e imprensa orientadas pelo princípio da imparcialidade, separação e harmonia entre os poderes, princípios axiais da Republica, foram duramente restringidos pela Ditadura Militar. Tempos de mobilizações; de resistir; de estar junto celebrando a felicidade pública como condição, ônus e bônus do Bem Comum. De compartilhar eventos desencadeados por cidadãos que se manifestavam em lugares de representação estudantil, de eventos científicos, de Instituições Comunitárias, Privadas e Públicas. De dizer sim às iniciativas locais, regionais, nacionais em favor da sustentabilidade ambiental, preservação das matas e relações adequadas com recursos naturais e dejetos de indústrias, de demarcação de territórios de descendentes de povos originários, de grupos separados e criminalizados, de simpósios sobre memória, direitos, liberdade de presos políticos, celebração da arte e da democracia como ocorreu no Cio da Terra. De vigorosas mobilizações pelo restabelecimento pleno da democracia. Quase quarenta anos depois da Constituinte e mais do que 50 do encerramento das atividades de Os Tapes, continuamos distantes da efetivação do imaginário do Estado Democrático de Direito e diante de assédios totalitários e autoritários dispostos a anular lugares de poder que, por consentimento, acordo e lei, pertencem à totalidade e à diversidade da cidadania.

Temas, Música, Instrumentos.

Tapes está engastada em extensa região às margens da Laguna dos Patos, habitada, desde milênios por povos originários e, a partir do século XV, por levas de ibéricos de Portugal e Espanha e, desde o século XVIII, por africanos escravizados e seus descendentes. Também, por europeus, Povos do Oriente Médio, com destaque às regiões hoje, territórios de Portugal/Açores, Alemanha, Itália, Polônia, França, Síria, Libano, Palestina, Egito, Turquia, Uruguay e Argentina. Região de planuras que a vista só encontra limites nos altos de coxilhas e distantes cerros. Clima ameno, paisagem com muitos tons de verde e desenhada por lagoas, rios, matas e areais, que por milênios, atraíram e testemunharam deslocamentos, intercâmbios e conflitos, pensares, amores e reminiscências alegres ou lacrimosas de ancestrais. Nossos personagens, às vezes agitados outras silentes, contemplam movimentos dos lagos, rios e atracadouros, percorrem estreitos caminhos que serpenteiam banhados, cerros, areais, planícies costeiras, serras do Erval, e dos Tapes e, um pouco mais adiante o Pampa, a Patagônia e a Cordilheira dos Andes. Vias de deslocamentos de povos originários, de acolhida, conflitos, intercâmbios e adaptações entre humanos e seus instrumentos de trabalho e, também os de festejos laicos e religiosos. Desde nossos avós víamos e ouvíamos sons de rabeca, estribo de cavalo transformado em triângulo, pandeiro, pequenos e médios tambores com pele de cabras, gaita de botão, violas e violões em especial nas Cantorias de Reis que ocorriam anualmente nas regiões e povoados litorâneos relativamente próximos ao povoado de Tapes. Em meados do século XX e nos anos de informação/formação musical dos fundadores do grupo, havia largo intercambio de instrumentos usados no local e em outras mais distantes, entre eles: berimbau, marimbau, pandeiro, reco-recos, flauta transversal, bandoneón, piano, acordeon, gaita ponto, escaleta, gaita de boca, viola, violão, bandolim, cavaquinho e violino. De nossa parte, para em projetos musicais específicos, criamos ou adequamos instrumentos de sopro e de percussão entre eles: tumbaquara, taquareira, porongada, pequenos médios e grandes tambores, flautas de taquara. Devido as características de nosso processo de criação apresentação (quase à capela) optamos por apoio eletrônico mínimo, microfones de pedestal para voz e instrumentos adequados para audição de tônus quase acústica, decisão adequada, sobretudo quando ambiente e público das apresentações eram maiores.

Grupo amador

Nos organizamos de forma cooperativada para lidar com as demandas de sustentação e infraestrutura do Grupo. Nossas atividades públicas, em geral, eram realizadas em feriados e fins de semana e, salvo exceções, foram viabilizadas com recursos dos promotores. Entre os anos de 1982-1984, integrantes do Grupo se organizaram para realizar temporadas fora dos fins de semana em locais mais distantes dos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. Antes, durante ou depois da existência de Os Tapes, 09 integrantes exerceram atividades de músicos profissionais, 06 professores, 06 de funcionários públicos, 08 empresários e profissionais liberais.

Cartazes e afins

nas décadas de 70 e 80, jornais, rádios e televisões locais e regionais eram os meios principais para divulgação de eventos. No caso de Os Tapes e de grupos musicais e teatrais da época, promotores e parcerias assumiam, de fato, divulgação, acolhimento e tudo o mais que demandava a realização do evento. Cartazes em vitrinas de lojas, muros e murais de escolas e de universidades, às vezes, faixas nas Ruas, eram meios e lugares preferenciais de divulgação. A pequena coleção de imagens gráficas, frases e textos que as acompanham, selecionada entre materiais do acervo, indicam a diversidade de parceiros, promotores, motivos e contextos das apresentações. Uma pequena mostra deles, evidências de criatividade de artistas anônimos cujos talentos se expressam na confecção dos materiais utilizados e, na escolha das formas e lugares de suas instalações. Poucos foram guardados ou preservados, lembro/ que, em geral, depois das apresentações eram disputados carinhosamente como lembranças destes eventos. Décadas depois, testemunham iniciativas, instituições e grupos que promoviam singulares espaços instaurados como esferas públicas nos quais se afinavam encontros científicos, demandas sociais e celebrações artísticas. Registram partes da diversidade de acontecimentos e de redes de iniciativas tecidas no RGS nas décadas de 1970 e 1980; pautas ativas no âmbito de esferas públicas promovidas por grupos civis; instituições universitárias, secretarias de governo estaduais, municipais, clubes sociais, festivais de música. Oferecem, também, informações sobre parcerias e promotores de Os Tapes, sobre o protagonismo cultural de estudantes, instâncias universitárias, de grupos organizados da sociedade civil, de instituições governamentais e civis que atuam, entre canções, danças e vozes unidos nos caminhos da institucionalização plena da Vida Democrático Republicana.

Muitos caminhos e palcos, poucos estúdios frequentados.

Em dezembro de 1971, recitando e cantando, fomos acolhidos e registramos nossa identidade pública, no palco do Cine Pampa de Uruguaiana. A ele voltamos, nas três edições seguintes como concorrentes e, na quinta e décima, como convidados. Em inícios de 1972, fomos convidados para apresentar no pequeno palco da sede Gaúcha da OMB Vida, Cisma e Canto de um Farrapo. Na época enquanto preparávamos desde os primeiros meses deste ano nossas composições para a 2ª edição da California nos ocupávamos com a estreia de nosso primeiro projeto Canto da Gente no Teatro De Câmara de Porto Alegre. Desde então, em parceria com outros grupos, inicialmente com aqueles que foram pioneiros nas primeiras Califórnias fizemos várias apresentações coletivas em Uruguaiana, Santa Maria, Carazinho e Porto Alegre. Com o passar dos anos a experiencia do Grupo de muitos palcos e de trechos de cantorias à capella se consolidou. Em certas ocasiões, sem planejamento. Isso ocorreu em apresentação com o auditório da UFRGS lotado ao ocorrer uma queda de luz e continuamos a apresentação, no escuro, sob estrondoso aplauso do público. Recursos eletrônicos foram decisivos para nossas apresentações em auditórios de espaços amplos de teatros, cine teatros, clubes sociais e em instituições escolares e universitárias. Também, para o caso de apresentações coletivas em espaços abertos ou ginásios de múltiplos usos. Algumas vezes nos apresentamos em criptas e naves de Igrejas, outras na rua, em nossos ensaios gerais na frente de nossa Cabana na Vila dos Pescadores em Tapes, ou em salas de aula em Escolas Rurais, Não raro em palcos em eventos festivos ou em favor de diferentes demandas sociais.

Formatos de apresentações, textos, programas, repertórios.

Nossas apresentações, em geral, estão relacionadas às duas retrospectivas e aos oito projetos temáticos constituídos por obras de Domino Público, de Autores escolhidos e de nossa Criação. Para o formato das Retrospectivas constituíamos repertórios que variavam entre 17 e 21 músicas escolhidas de repertorio mais amplo para ocasiões nas quais a apresentação se estendia. Nos oito projetos específicos, disponibilizávamos folhetos ou textos com informações incorporadas na estrutura do Projeto. Canto Da Gente, Americanto, Chão, Estrada e Canção e, em especial Não Tá Morto Quem Peleia exemplificam estruturas auto/explicativas dos projetos, pois que, em quase meia hora, o palco projetava imagens e gravações de vozes dos protagonistas nos quais assentamos nossas recepções e interpretações das obras que o constituíram. Em Festa de Reis, também, simulávamos os ambientes de terreiro e de sala da residência nos quais a cantoria, em seus atos, acontece.

Álbuns e outros registros de Os Tapes.

Canto da Gente 1975 (Marcus Pereira), participação álbuns da coleção Música Popular do Sul da Marcus Pereira (1975) Não Tá Morto Quem Peleia, 1978 (Marcus Pereira), Os Tapes 1982 (Cantares) e o CD Estações das Águas 2002 (Independente) registram Obras de Os Tapes e interpretações de obras de DP e de Outros Autores. Parte expressiva delas, registradas em fitas cassetes com apresentações ao vivo, esperamos possa ser recuperada e disponibilizada. À exceção das obras inscritas nas 03 edições da Califórnia da Canção Nativa de Uruguaiana (1972-74), não tínhamos intenção de registrá-las em LPs. Nossa disposição mudou a partir de nossos encontros com Carolina de Andrade e Marcus Pereira. Tudo começou, quando Carolina , ao ler, na portaria de Hotel em Tapes onde estava hospedada, decidiu conferir o evento anunciado por um cartaz, onde se lia: Hoje, 19 de maio de 1975 no Ceart, tem Sexta Som . Na época, em andanças pelo Sul, Carolina, acompanhada por Paixão Cortes, observava, entre outras manifestações populares, cantorias de ternos de Reis na Região para integrarem a Coleção Música Popular da Região Sul, da Gravadora Marcus Pereira. Esse encontro fortuito impactou a nós e a Carolina. Ela, segundo suas palavras, pelo que viu, ouviu em nosso pequeno teatro, quase de Arena – espaço de arte e convivência com nossos visitantes e artistas das cercanias e de lugares mais distantes. Nós – impactados pelo projeto da gravadora que Carolina e Marcus, nos convidaram para discutir e compartilhar. Esse encontro nascido de acasos da vida, fortaleceu-se nas conversas e, sobretudo, na estima e honrosa parceria que nos legou, bem mais que registros de nossa obra, a convivência, o afeto e a admiração que partilhamos em São Paulo, Rio e nas visitas que Carolina e Marcus fizeram ao Sul e à Tapes.

Apresentações além do sul.

A Condição de Grupo Amador, sobretudo pelo fato de que viajávamos para apresentações em fins de semana, oferecia dificuldades às gravações em estúdios ou às excursões em lugares mais distantes. Mesmo assim, não sem muito planejamento, conseguimos realizar algumas raras apresentações de difícil execução pela maioria dos integrantes do Grupo, entre elas: 1971. Dezembro. Paso de Los Libres, Corrientes, Argentina; dezembro de1974; Paso de Los Libres, Corrientes, Argentina; 1974. 1974, Cosquin Argentina, Julho Goiânia – 2ª Feira Nacional dos Campeões com Novos Baianos e Martinho da Villa.1974. Agosto Apresentação na Barraca do RGS, na Feira da Providência, Rio de Janeiro.1975. Gravação em São Paulo de Música Popular do Sul da Gravadora Marcus Pereira. Lançamento de Música Popular do Sul. Anhembi São Paulo; e João Caetano Braun, Noel Guarany, Inezita Barroso. Apresentação no João Caetano, Rio de Janeiro.1979. Apresentação em Viena e Berlim 1979. Ver datas e outras informações no acervo. San Vicente, Argentina, 1986.

Espaços de encontros e de ensaios

1. Galpão Fundos da casa do Waldir. (1971-1972) Rua Alcides Alfonsin, Centro. 2. Escritório. Avenida Getúlio Vargas (1973) Centro. 3. CEART – (1974/1978) Rua Alcides Alfonsin. Centro. 4. Cabana de Os Tapes (1978/1982) Rua Caramuru. Vila dos Pescadores. Balneáreo Rebello. Garagem de Eurico Veleda (1982/1984). Rua Tiradentes, Balneáreo Rebello Escritório Casa de Claudio Boeira Garcia (1982-1986). Rua Caramuru 40. Balneáreo Rebello.

Notícia sobre trajetórias de ex-integrantes de Os Tapes

José Cláudio Leite Machado (1971-1973) Rafael Koller (1971-1974) Waldir Souza Garcia (1971-1980) e Acy Terres Vieira (1974-1978) realizaram extensa e variada atividade musical individual e em Parceria com outras pessoas ou Grupos na qual constam obras de criação musical, apresentações, gravações de Lps, CDs, solos e recitação de poemas. Airton Madeira, Alberi Gonçalves, Claudio Boeira Garcia, Darci Dias Pacheco, Francisco Koller, Jorge Luis, Jose Júlio Prestes, Otacílio Lopes Meirelles, Pedro Ivo Dapper, Silvio Luis Pereira, exerceram, exercem, com aveludada e retumbante voz:ou eventualmente exercem atividades relacionadas às artes e à música.

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Resumos e Datas dos Projetos

Criarmos nossa obra no andamento e tom de nossas escolhas, em conversas e debates sem prazo, por experimentos poéticos e sonoros individuais e partilhados, por urgências que nos impomos. Com melodias, ritmos, palavras, lembranças, estórias expectativas e acontecimentos reais ou imaginários advindos de passados que não passaram, de presenças que ainda são/estão, por autorias de nossa época ou engastadas nas memórias de muitos.

01 – Vida, Cisma e Canto de um Farrapo (outubro – dezembro de 1971).

Composta no 2º semestre de 1971 escolhida, apresentada e premiada hors-concours na 1ª California da Canção Nativa de Uruguaiana no mês de dezembro de 1981. Duração de aproximados 25 minutos. Esta obra se perfaz por recitação e três movimentos musicais com trechos de solos e vocalizações para duas ou três vozes. Nela um Farrapo, de “pura imaginação” evoca, devaneia e recita motivos de participar da guerra ao lado de alguns protagonistas que conheceu ou ouvir falar antes, durante e após seu encerramento. Enfatiza crenças/razões de ter “largado”, ainda que provisoriamente, “seu mundo”: família, vizinhos, compadres, patrões, lida e alguns animais no campo e festejos e danças de vez em quando: um modo de viver, no qual tudo estava bem e deveria permanecer como sempre foi! Assim entedia, eram as coisas do mundo, desde tempos que suas lembranças alcançavam, que seus olhos e ouvidos viram e ouviram na campanha e nas coxilhas em que viveu distante de plagas, cerros, rios e lagoas por onde a guerra se espalhara. Ensimesmado em seu peculiar código de ética e noção de liberdade, que julgava serem os mais ajustados o mundo, imagina ou repete falas ouvidas sobre demandas e negociações econômicas e políticas que moviam os protagonistas da guerra e seu encerramento. Da prosa e versos perplexos e enigmáticos, deste Farrapo, transcritos por mim, em uma longa noite de outubro de 1971, nasce a primeira obra compartilhada por três dos fundadores do Grupo Os Tapes. Claudio Boeira Garcia (texto, composição, vocal) José Claudio Leite Machado (composição, violão e voz) e Waldir Souza Garcia (violão, composição, voz e recitação, Ordelino Silva (percussão). Para nossa surpresa, a inscrição foi aceita e, na noite de apresentação – ao mesmo tempo em que os organizadores justificaram porque estava sendo apresentada e retirada, por óbvio do concurso – foi agraciada com Distinção Especial pela Comissão Organização e Jurados do Festival. No mesmo ato recebemos o convite para apresentá-la na cerimônia de premiação e de encerramento da 1ª Califórnia da Canção Nativa no dia 19 de dezembro 1971. Na noite de encerramento, das mãos de Paixão Cortes e ao lado Henrique de Freitas Lima, recebemos uma Calhandra em cujo verso se lê: Prêmio Especial – Ao Conjunto Os Tapes – pelos novos rumos que abre no trato do tema nativo riograndense. 1ª Califórnia da Canção Nativa. Uruguaiana Dezembro de 1971. Ordem Dos Músicos, secção do RGS.

02 – Canto Da Gente (1972).

Em janeiro de 1972, animados pelo ambiente da Primeira California da Canção Nativa em Uruguaiana em dezembro de 1971 e, além disso, pela gentil, generosa e pedagógica acolhida dada a nós em relação à Vida, Cisma e Canto de Um Farrapo, em inícios de 1972, contando com a participação de Rafael Koller e Álvaro Barbosa Cardoso, nos envolvemos em intensa atividade musical orientada para os seguintes propósitos: atender convites, para apresentação de Vida, Cisma e Canto de um Farrapo e outras composições em Porto Alegre e adjacências; preparar um espetáculo para atender convite da Secretaria Municipal de Cultura de Porto Alegre para 04 apresentações nos fins de semana no Teatro de Camara; preparar músicas para inscrição à Segunda Califórnia no final deste ano. O fato de que, nossa estreia em Uruguaiana adotou um modus de apresentação que incluía recitação textual e música, nos deixou à vontade para, em nossa primeira apresentação em POA, integrar Vida, Cisma e Canto de um Farrapo em Canto da Gente que iniciava com Rafael executando, no Bandoneon, una zamba andariega em apoio a recitação de em espécie de declaração/manifesto18 sobre do grupo em relação à música, instrumentos, autores, melodias, ritmos, fronteiras, língua, espaço, tempo, indumentária, etc. O repertório de Canto da Gente e 1972, foi constituída Além de VCCF por inéditas do Grupo, entre elas, Barqueiro, Canto da Gente, Teatino, e outras do cancioneiro Latino – Americano (Ranquel…). Devido a acolhida do público VCCF a Secretaria de Cultura de POA promoveu mais 05 entre agosto e setembro, além das 04 programadas para o Teatro de Câmara no mês de julho deste ano.

18 Em nossas conversas e mateadas reiterávamos a compreensão de um fazer musical sem demarcações de “fronteiras de tempo e língua”. Sobre isso, redigi o texto recitado nas apresentações de Canto da Gente na nossa temporada de estreia no Teatro de Câmara em POA em 1972.

03 – Americanto (1975).

Estreiou no Primeiro Simpósio Nacional de Estudos Missioneiros – realizado na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Instituto Dom Bosco em Santa Rosa nos dias 22-26 de outubro de 1975. Entre os anos 1972-1974, nosso repertório já evidenciava que os povos originários e seus descendentes19 fariam parte de nossos temas referenciais, pois, logo no início do Grupo compusemos Gauchê, Funeral Guarani e Cheraçar Y Apacui. Obras inscritas em três edições da Califórnia da Canção Nativa em Uruguaiana e Teatino20 em Canto da Gente, em 1972. Americanto, em seu formato de textos e cantos, advém de nossa disposição de apoiar e compartilhar de uma iniciativa acadêmica em prol da investigação, debate e memória das reduções jesuíticas guaranis nos séculos 17 e 18 no sul do Brasil, Argentina e Paraguai. Eventos ocorridos no passado, por seus desdobramentos sempre impactam a disposição moral para compreender por que aconteceram e a lidar de forma política com os efeitos mundanos desastrosos da violência física e simbólica desencadeada por processos de dominação, quebra de resistência e apagamento de conflitos ocorridos desde que diferentes povos e pessoas caminharam e se estabeleceram no sul da América. Felizmente, ao longo desses séculos e percursos. se expandiram, também, noções e práticas, entre elas às imaginário de sociedades democráticas como padrões que norteiam o que pode ser considerado desmedido, trágico ou sensato nos percursos dos humanos no mudo. Estamos a caminho, mas ainda distante disso. Além de Santa Rosa, Americanto foi apresentado em outras cidades Missioneiras e em temporada no Teatro de Camara de Porto Alegre e em cidades da região metropolitana.

19 Entre outras, Antropologia, história, paleontologia, arqueologia e genética, têm feito notáveis descobertas acerca dos deslocamentos de pequenas ou grandes levas de humanos através de rotas planetárias por ciclos climáticos ou de outras naturezas. Aqui, também, por milênios e séculos, chegaram e se moveram os designados povos originários assim como outros, através de extraordinária rede de trilhas, vias e caminhos naturais ou abertos, em tempos primevos ou de outros que se sucederam.
20 Teatino que “nasceu por acaso de uma noite de curra” exemplifica caso extremo, não incomum, de gaúhos e gaúchas geradas à época das primeiras levas de espanhóis e portugueses. Quando crianças, ouvíamos em Tapes, homens e mulheres idosos dizerem que seus avós tinham laçado suas avós com “boleadeiras”nos campos.

04 – Canto da Gente II e Temas de América Andina e Pampeana (1975/1976).

Entre os anos de 1972 – 1976, parte de nosso repertório musical registrado nos Lps da Califórnia da Canção Nativa, na coletânea da Música Popular do Sul e o Lp Canto da Gente, pela Marcus Pereira, evidenciam que, esta seria uma opção que a exceção do primeiro e do último projeto faríamos durante nossa atividade. É o que ocorre, também, em Canto da Gente II e Temas de América Andina e Pampeana. A primeira parte, constituída por composições nossas e de outros autores, a segunda parte, Temas de América Andina e Pampeana, obras instrumentais ou do cancioneiro da Bacia do Prata e dos Andes, incluindo um poema do Cubano Jose Marti e do Chileno Pablo Neruda. Para esta parte do projeto criamos e adaptamos alguns instrumentos de sopro e de percussão. Esta segunda parte foi possível por uma feliz conjunção de antecedentes, acasos e motivações que pode ser assim resumida: Tapes, relativamente próxima às fronteiras uruguaias argentinas, facilitou que, desde meados da década de 60, obtivéssemos obras literárias e musicais de compositores e intérpretes referenciais desses dois países e, também, do Paraguay, Bolívia, Chile e Peru. Obras que contribuíam para animar nossas tertúlias literárias e musicais, realizadas entre outros locais, em minha casa e no galpão de Waldir Garcia. A repercussão disso, em nossa obra está manifesta em Canto da Gente (1972) Os laços com o cancioneiro destas Nações foram confirmados e estreitados com nossa viagem Cosquin em 1974 e, sobretudo com uma casual e extraordinária visita que, sem hesitações, se fez quase que instantaneamente em convite. aceite e parceria entre os Tapes e o jovem casal de Músicos de La Plata (Argentina) Miguel Angel Aquilano. Miguel (Arranjos vocais e instrumental) e Stella Maris Raymondo. (Língua Espanhola e apoio à atividade de Miguel). Em inícios do mês de junho de i975 já estávamos à postos e animados para realizar a segunda parte deste projeto que designamos. Canto da Gente II e Temas de América Andina e Pampeana. A primeira, pois com nossas composições criadas entre os anos de 1972 e 1975 a segunda, com a escolha do repertório para a segunda parte do projeto.

05 – Não tá morto quem peleia (1977/1978).

Durante anos, com máxima atenção, nos distanciamos daquilo que sempre esteve muito próximo de nós, para de fato, escutar, observar, registrar, fotografar o que, embora aparentemente escondido, latejava na memória, sentimentos, olhares, sorrisos, saudades, não raro, como sorrisos e lágrimas generosas que vertiam da memória, sentimentos e experiencias de pessoas com quem convivíamos ou ouvimos falar desde nossas infâncias. Uma professora e seu Bandolim nas aulas de música na década de 50, mestres de Ternos de Reis e de Gaita Ponto, instrumento indispensável nas bailantas familiares e Cantorias dos Santos Reis com seus versos sem fim que poderiam ser recitados madrugada à fora, caso os donos das casas, por “judiaria, prazer e alegria” os acolhesse os “prendessem” em cantorias de versos por horas sem prazo. Versos sem dono, que todos declamavam em suas diversidades e variações temáticas provocando desde ÓS de espanto, saudades, elegância, gentileza, às gargalhadas de puro gosto em dar risadas, dos relatos prolongados dos testemunhos e compositores que designamos como Grupo da Vila (Dores de Camaquã), Valsas em homenagem a Vila. O maestro que compõe um Dobrado em uma região de imigração europeia dos inícios do século 19, para comemorar, cinquenta anos de fundação de sua banda. Acy, Waldir e eu, animados, sobretudo, pelos anos que fomos docentes em escolas rurais próximas de Tapes, com as pessoas que viviam na região, no meu caso em distritos da Serra do Erval, Dores de Camaquã, Emboaba, Sertão Santana, Pirapó, Garambéu, Barão do Triunfo e pessoas que residiam em Tapes, nos ofereceram, nestes anos, informações e testemunhos decisivos ao Projeto Não tá Morto Quem Peleia, mesma designação para nosso segundo Disco gravado Marcus Pereira. O impacto deste projeto sobre nós, pessoas com as quais convivemos, entrevistamos e gravamos, repercutiu nos espectadores, críticos teatrais, musicais e literários que assistiram as noves sessões de sua estreia no Teatro de Câmara em Porto Alegre. Mais que parecer, as vozes, sons, imagens daquelas pessoas ainda latejavam nas mentes corpos, lembranças e vozes do que já tinham vivido, ouvido falar ou testemunhado em experiencias ou em melodia, verso, cantos e causos. Emoção, de início surpresa de nossos entrevistados, logo enlaçada por expressões de satisfação, por nossa genuína paciência, pulsante interesse e inquieta disposição de escutá-los e ouvi-los sem prazo de horas, tarde e noite adentro. Waldir, Acy e eu, nas planuras costeiras de lavouras de arroz de Tapes, em “estreitos caminhos” da Serra do Erval ouvimos, conversamos e fotografamos os protagonistas deste projeto, em suas casas nos “ocos da serra” como diziam, por muitas de horas os escutamos, também no CEART com todos os integrantes do grupo os escutamos e indagamos. Para nós, que de desde o início, fomos pretos, brancos, amarelos parceiros de nossos projetos cosmopolitas, nada foi menos celebrado que outras os arranjos que fizemos para Cantigas de Quicumbi de Rio Pardo e do Maçambique ativo e centenário do Grupo Afro Brasileiro de Osório, ambos no Rio Grande do Sul. Alegria serena e estridente ecoada em tempos sombrios sobre silêncios sobre a chegadas de colonos europeus no RGS durante os século 19 e 20, de negros escravizados bem antes deles, mas também, sobre povos pioneiros que antes de todos os “pobres e oprimidos do mundo” sofreram da expulsão, submissão e genocídio. 

06 – Chão Estrada Canção (1978/1979).

O fato de vivermos em Tapes, entre os anos 40 e 70, nos colocou, em um lugar privilegiado, para observar, testemunhar e sofrer impactos relevantes que o êxodo rural produziu na vida das pessoas que viviam na zona rural e em sedes urbanas de municípios pequenos, próximos ou distantes da Capital e da região metropolitana. Antes da inauguração da ponte em 1959, a Lagoa, Balsas, veículos automotores e a Estrada Real eram caminhos e meios de transporte de cargas e de pessoas com destino à Porto Alegre e às localidades situadas na margem norte do Lago Guaíba21. De repente, tudo se acelera, não mais uma, duas ou três viagens de ônibus por semana em estradas arenosas ou embarradas, não mais luzes acesas, em períodos do dia ou da noite; rádios municipais noticiam acontecimentos locais, ou em cadeia, de outros lugares do país e do mundo. As locais animam, nos extensos distritos municipais, encontros e bailantas de aniversário e de outros festejos com músicas dedicadas e recepcionadas por aparelhos radiofônicos ativados por baterias carregadas por cataventos. Nos caminhos da ponte do Guaíba crescem sem cessar, movimentos de pessoas, ônibus, caminhões, carros e outros meios de locomoção em beiras de estradas, encostas de coxilhas, bairros antigos e novos espaços que passam a ser ocupados de maneira acelerada. Em cidades pequenas como Tapes, sabia-se nomes e dados de estudantes, trabalhadores jovens ou de pessoas meia idade que migravam para Porto Alegre e cidades da região metropolitana. Éramos, todos, atores, testemunhos, personagens e comentadores dos deslocamentos populacionais acelerados para Porto Alegre e cidades vizinhas. Não era necessária, expertise em ciências sociais, administração pública, ou em áreas afins, para saber do caos desmesurado estabelecido nos espaços urbanos mais atrativos. Tempos de aguçar faculdades intelectivas e sentimentos morais para lidar com este fenômeno cuja aceleração lançava centenas de pessoas em direção aos banhados, charcos, subidas ou ladeiras e de morros de Porto Alegre e da região metropolitana. Na primeira década de existência de Os Tapes, este evento e os impactos sociais e morais inspirou composições tais como: Gurisito, Peão Velho e Janaíta, João da Ponte, Noite Tirana, Um Doutor e Campesino, entre outras integradas em Chão Estrada Canção. Nas discussões sobre uma música para encerrar este projeto, antigo verso popular, que algumas vez se ouvia meu pai cantar, acompanhado de sua gaita de botões: cante e dance minha gente que uma noite não é nada, os galos já tão cantando tá chegando a madrugada. Verso que, para ele, denotava alegria, pois que, nas cantorias das bailantas de Tapes, ecoava como um convite para que a dança se estendesse, um pouco mais depois do sol nascer. Tarefas do cotidiano poderiam esperar um pouco mais em favor da alegria, sobretudo quando nenhum prejuízo trazia à normalidade da vida e do mundo no qual viviam. Em nosso caso, significados de perplexidade, indignação, esperança e alegria, pareciam ter pesos iguais. Eruditos sobre possibilidades polissêmicas deste verso, sabíamos que a alegria propiciada pelas bailantas alongadas, poderia ser conforto, prenúncio e, também, expectativa de que a dura noite do êxodo, em suas causas, formas e consequências, ao ser pronunciada e cantada lançaria luzes sobre compreensão sobre o que observávamos e tentávamos apreender seus significados e consequências. Tínhamos noção de que não estávamos imersos em consequências de acasos nem de turbilhões irrefreáveis! Acreditávamos que teria sido possível lidar com a veloz passagem do campo para a cidade sob formas menos dolorosas. Não por acaso, pois, nossos textos, melodias, arranjos vocais e instrumentais fazem escorrer, espanto, indignação e dor na descrição de vidas e de processos testemunhados. Ouvir, Chão, Estrada e Canção, quarenta e tantos anos depois, me fez reviver experiencias de uma época as quais ecoam nas palavras, melodias, instrumentos, vozes e vocalizações. Parece que pasmados estávamos, sem saber como enfrentar um turbilhão que as luzes da razão não foram capazes de prevenir nem conduzir em termos razoáveis. Lá estávamos no Teatro de Arena, impactados, talvez, menos por sermos personagens e testemunhas do êxodo, mas por tematizar experiências cujos processos, desdobramentos e atropelos morais nos confrontava em tempo e velocidades incomparáveis ao que, com lentidão de séculos se efetivou na Europa, Atropelos cujas devastações estão longe de serem avaliadas e enfrentadas por nós que vivemos e atuamos em único e frágil habitat espacial.

21 Também para transportar os “rolos de filmes” para garantir as sessões do Cine Teatro Roma e dos Circos nacionais e internacionais que acampavam para “descansar as feras” e oferecer algumas sessões em Tapes e cidades localizadas nos rumos de Pelotas, Rio Grande, Bagé, Montevideo e Buenos Aires.

07 – Retrospectiva I – Cantos e Andanças. (1979 -1981).

Para celebrar os oito anos de existência do grupo criamos a Retrospectiva1 constituída por seleção de composições nossas e de outros autores. Com esta retrospectiva nos apresentamos, por aproximadamente dois anos, em cidades do Rio Grande do Sul e, em algumas do Oeste e do Leste de Santa Catarina.

08 – Festa de Reis (1982).

Na região de Tapes, com a expressiva chegada de nossos ancestrais dos açores no século 18, chegaram as Cantorias de Reis. Variações melodias, de entonação e formação dos grupos à parte, ninguém perguntava de onde provinha o costume de cada final de ano, renovar e esticar os coros dos tambores, reservar um tempo de ensaios com mestres, cantores e instrumentistas das vizinhanças ou até de mais distâncias, para repassar versos e vozes dos Ternos de Reis. Tempo de preparo, entre outros, dos obrigatórios doces do Natal, entre os quais se destacavam doces de figo e abóbora em calda. Entre 26 de janeiro até o dia 06 de fevereiro apareceriam para cantar e festejar o nascimento de Cristo e a visita dos reis do Oriente. O Mestre era quem puxava a cantoria, que aqui em Tapes, se perfazia por versos repetidos em terça por um duo em geral encarregados do pandeiro e do estribo. Tapenses de minha geração cujas famílias cultuavam a tradição do Terno De Reis, em cuidada etiqueta, o Mestre que tocava Gaita ponto e dirigia a cantoria, retinha na memória e capacidade entoar e improvisar tantos versos quantos necessários, até que a gentileza ou judiação dos donos da casa atendessem os pedidos de Porta Aberta. Em geral, sobretudo em casos de Ternos prestigiados por suas notórias virtudes musicais, a “judiação” era prolongada até que cantassem o infalível verso, com apelos às donas da casa, que ameaçava a retirada caso a porta não fosse aberta. Em nossas infâncias em Tapes nas décadas 40 e 50 e 60 ainda era tão seguro que Ternos cantariam nestas datas como era fato que depois da noite amanhecia. Em nosso Folia de Reis, nos inícios dos anos 80, com a primeira parte com iluminação quase zero, simulando a falsa escuridão das casas, nos postamos no palco, como se estivéssemos no terreiro e a casa com luzes apagadas o auditório. Uma vez encerrada a cantoria na plateia iluminada, cantando e dançamos músicos e plateia celebrando alegrias que a vida e encontros propiciam. 

09 – Retrospectiva II (1982/1986).

Depois de completarmos dez anos, entre os anos (1982- 1984) realizamos a 2ª Retrospectiva constituída por repertório proveniente de composições que inscrevemos em nossas 04 participações nos anos iniciais das Califórnias da Canção Nativa em Uruguaiana (1971-1974) e canções selecionadas dos repertórios dos projetos apresentados até o ano de 1982. Nesta 2ª retrospectiva as apresentações foram feitas em maior número e se estenderam por várias regiões dos Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. Por isso, os integrantes que dela participaram se organizaram de tal modo que pudessem ter tempo disponível e, também, para que, com relativa facilidade fizessem constantes retornos para Tapes, onde nossas famílias residiam. Assim como na primeira Retrospectiva os Programas das apresentações listavam entre 18 e 21 composições de nossa autoria, de outros autores e de domínio público.

10 – Estações das Águas (1972-2003).

Lagoa dos Patos e cercanias! Cenários que, na variação dos ventos, cores e movimentos das águas embalam devaneios, quietude, espantos, sons de pássaros e o que de mais habita e emerge da condição humana. Lugares de moradia, desde séculos, de caminhantes de distantes proveniências. Marcas e marcos cravados na memória de quem foi parido, mergulhou corpo, sentidos e sentimentos nas areias e juncais costeiros, barcos de pesca e de transporte de cargas e passageiros, zarpando em seus sons e apitos, dos ancoradouros de estacas. O prazer de ver, ouvir e imaginar cenas passadas, presentes e futuras, nas enseadas e seus entornos, fecundou nosso empenho de enfeitá-las com nossos versos e melodias. Estações das Águas verteu do zelo em preservar mundos na memória, sobretudo, o sabor, frescor, olor e quentura de suas águas preservadas que nexos milenares do universo garantiram. Não por acaso ou planejamento que Estações das Águas, em sua criação, apresentação22 e registro em CD (2002) ultrapassou o tempo de existência formal do Grupo Os Tapes (1971 – 1986). Seu início desvela as marcas do contexto sobre nossas palavras e sons: Entre o Mar e o Pampa há uma Lagoa (2ª Califórnia da Canção Nativa, 1972); Barqueiro 1972 (Canto da Gente) e Dança da Lagoa do Sol (1974), composta/assobiada pelo Waldir quando em uma Van escolar subíamos para uma Escola na Serra do Erval, tagarelando e imaginando sons de flautas e chocalhos executados por descendentes dos povos originários celebrando o amanhecer na Lagoa. Quase uma década depois, nos anos de (1981-1983), insistentes velas, pesqueiros, redes, remos, sereias, virações, proas, dunas, enseadas, danças nos terreiros, Felícias, filinhas, Olegários, plantações de cebola, remos, espinhéis, emergem nas cordas dedilhadas ou ritmadas, nas vozes sussurradas ou estridentes de Airton, Claudio, Linck e Otacílio, nascem, entre outras, Versos de Itapuã à São José, Perguntas, Zamba sem Porto, Sussurros e Olegário. Pouco antes, ocorreram expressivas mobilizações desencadeadas por movimentos civis, e instituições públicas engajadas nas lutas em defesa das pautas ambientais da época. Época de participação intensa dos Tapes nestes eventos. As composições desta fase, são inscritas nos Programas de Apresentação e registradas no LP da Gravadora Cantares, dirigida por Martin Coplas em (1982). Entre 1986-1999, Airton Madeira, Otacílio Lopes Meirelles, Silvio Rebelo, de forma intensa (e eu, em minhas estadias em Tapes) fizemos uma imersão no repertório e acervo de obras do Grupo. De releituras de clássicos de Os Tapes e de um número expressivo de novas criações, é composto o repertório do Projeto Estações das Águas: o último projeto temático, é concluído e apresentado depois do encerramento das atividades de Os Tapes. O mesmo ocorre com seu registro em CD concluído em 200223. Esta súmula de percursos da Criação, Apresentações e Registro de Estações das Águas a qual resumi para leitura do Mestre de Cerimonia na apresentação em Ijui no ano de 2002, não evitou, talvez pela presença em palco de Airton Madeira, Claudio Boeira Garcia, Darci Dias Pacheco, José Júlio Prestes e Otacílio Lopes Meirelles, conhecidos de várias apresentações do Grupo em Ijui, que o apresentador, mesmo depois de longa e pausada leitura de meu texto, sem hesitar, entoasse em alto e bom som: Estimado Público! Com vocês! Os Tapes!

22 Apresentado em mais de 20 ocasiões sendo que em três, depois da que ocorreu Ijui em 2002.
23 Airton Madeira e Otacílio Lopes Meirelles, participaram de todas as apresentações, em várias: Gabriel e Ricardo Madeira (filhos de Airton), Darci Dias Pacheco, Jose Júlio Prestes e Silvio Luis Pereira, Paulo Rudi Schneider, Matheus Schneider, Carlos Cazarin Garcia e Gordo Lopes. No CD de Estações das Águas em 2002: Airton Madeira, Celau Moreira, Claudio Boeira Garcia (Direção Musical) Carlos Cazarin Garcia, Cristiano Garcia (Produção), Gordo Lopes, Mario Barros, Matheus Schneider, Paulo Dorfmann, Wagner Cunha.