Americanto (1975)

Estreiou no Primeiro Simpósio Nacional de Estudos Missioneiros – realizado na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Instituto Dom Bosco em Santa Rosa nos dias 22-26 de outubro de 1975. Entre os anos 1972-1974, nosso repertório já evidenciava que os povos originários e seus descendentes1 fariam parte de nossos temas referenciais, pois, logo no início do Grupo compusemos Gauchê, Funeral Guarani e Cheraçar Y Apacui. Obras inscritas em três edições da Califórnia da Canção Nativa em Uruguaiana e Teatino2 em Canto da Gente, em 1972. Americanto, em seu formato de textos e cantos, advém de nossa disposição de apoiar e compartilhar de uma iniciativa acadêmica em prol da investigação, debate e memória das reduções jesuíticas guaranis nos séculos 17 e 18 no sul do Brasil, Argentina e Paraguai. Eventos ocorridos no passado, por seus desdobramentos, demandam esforços para compreender o que aconteceu e como lidar com os efeitos mundanos desastrosos da violência física e simbólica desencadeada por processos de dominação, quebra de resistência e apagamento de conflitos ocorridos desde que diferentes povos e pessoas caminharam e se estabeleceram no sul da América. Felizmente, ao longo desses séculos e percursos. se expandiram, também, noções e práticas, entre elas às imaginário de sociedades democráticas como padrões que norteiam o que pode ser considerado desmedido, trágico ou sensato nos percursos dos humanos no mudo. Estamos a caminho, mas ainda distante disso. Além de Santa Rosa, Americanto foi apresentado em outras cidades Missioneiras e em temporada no Teatro de Camara de Porto Alegre e em cidades da região metropolitana.

1 As ciências humanas e afins têm feito notáveis descobertas acerca dos deslocamentos de pequenas ou grandes levas de humanos postas em movimento por razões climáticas ou de outras naturezas. Aqui, também, por milênios e séculos, chegaram e se moveram humanos, através de extraordinária rede de trilhas, vias e caminhos naturais ou abertos, em tempos primevos ou de outros que se sucederam. 
2 Teatino que “nasceu por acaso de uma noite de curra” exemplifica caso extremo, não incomum, de gaúhos e gaúchas geradas à época das primeiras levas de espanhóis e portugueses. Quando crianças, ouvíamos em Tapes, homens e mulheres idosos dizerem que seus avós tinham laçado suas avós com “boleadeiras”nos campos. 

🔈 Áudios já catalogados de apresentações ao vivo de Americanto, serão disponibilizados à medida que sejam processados.

Letras

Texto (recitação 1)
Claudio Boeira Garcia

Hoje sei pouco…
Hoje sei muito…
Andei muito por esta pátria que um dia chamaram de América. Naveguei por todos os seus rios e suas matas me foram quentes e suaves entranhas. Andei tanto que não sei de onde parti. Não sei onde andam as nascentes dos rios em que me banhei, não sei quando e se de além-mar cheguei! Ah! Sei que me estudam e se amontoam teorias sobre mim: de onde cheguei? Meus nomes? Minhas crenças? Minhas guerras? Meus senhores! Antropófago Poeta! Contradições Possíveis! Corpo belo de atleta. Fui Inca, Aimará, Charrua, Minuano, Tupinambá, Araucano. Fui Pampa, fui Mata, fui Altiplano

América
Letra e Música Claudio Boeira Garcia

Mãos cálidas de amor
Partejam de tuas entranhas
A face irmã primogênita
Tupinambá, Aimará, América
Aragana, Araucana, América
Mãos variadas de cor
Afagam teu ventre fecundo
De carne irmã flor América!
Guarany /Calchaqui, América!
Sempiterna, sempre eterna América.

Texto (recitação 2)
Claudio Boeira Garcia

Nomes mil! Línguas mil! Morte Vil! Fui servil, fiz minhas choças plantei roças e domei rebanhos!

Andei e andei tanto que perdi meu nome!
Música: Kaingang Letra e Música Claudio Boeira Garcia

Kaingang americano
Minha pátria é andarilha
Já mudei de tanto nome
Me mudei antes da fome

Texto (recitação 3)
Claudio Boeira Garcia

Nheçu e Ñheenguiru me confundem! Todos meus deuses se foram!
Meus rios secaram! A lança me abandonou!
As matas são Capoeiras! Minha memória está esfumaçada!
Os guerreiros morrem sem lança!
Tupã! Cristo Opá Añhandejara! Estou só
São Miguel! São Miguel! Centenas de Povos! A américa toda geme…geme…geme…Eu os visitava! Não era eles! Era eles!
Fundi Ferro, Sinos, cantei, aprendi, ensinei! Esculpi imagens de outros e a minha!

Eu Tinha
Letra: Claudio Boeira Garcia. Música: Manoel Acy Terres Vieira.

Eu tinha sementes plantei!
Eu tinha Rios naveguei!
Eu tinha amores amei!
Eu tinha as guerras lutei!
Eu tinha meu canto cantei!
Eu tinha as dores, chorei!
Eu tinha meu Deus, adorei!
Eu tinha meu grito, gritei!
Andei e andei, O tempo passou eu passei.

Texto (recitação 4)
Claudio Boeira Garcia

Hoje eu sei, sei muitas coisas…muitas coisas….Ameríndio! Índio dos pampas! Índio da América para outros sou! Para mim, sou a mistura; a própria carne desta terra fértil. Minha cor é a pele das matas e dos minérios multicores que se misturam em um só ser. Meu nome é santo como foram minhas guerras! Meu pranto são rios claros e sem remorsos! Meu corpo desnudo semeou a vida, sem pecados, nem vergonhas!

Cheraçar y Apacuy
Letra e Música: Claudio Boeira Garcia

Cheraçar y Apacuy
Na terra a dor pariu um rio
Cheraçar y Apacuy
Águas Claras cheias de amor
Cheraçar y Apacuy
Santa Tecla geme de dor
Cheraçar y Apacuy

Texto (recitação 5)
Claudio Boeira Garcia

Hoje eu sei que era bom! Andarilho como minha pátria! Minha nação caminhava com a caça e amamentou – se no seio úmido deste verde amplo e fecundo.

Missioneiro
Letra Claudio Boeira Garcia Musica: Jorge Luiz Ferreira

Sou Guarani
Sou Tape
Sou Missioneiro
Fui Athauálpa
Fui Traído
Fui mestiço
Fui Cristão
Fui Feiticeiro
Fui Tupac
Fui Araucano
Fui Justiceiro

Canto Guarany
Letra: Álvaro Barbosa Cardoso. Música Jose Waldir Souza Garcia

Não Canto prá gente
que ouve não sente
meu grito de guerra

Forjado na terra
meu sonho crioulo
dormia no poncho
tinia na lança
rasgava as entranhas de corpos estranhos.

Não canto prá gente
que ouve e não sente
meu canto de paz

No gesto a palavra
de mão que acenava
e voltava fechada
ao sentir a sombra da bota tacanha.

Eu canto prá gente que ouve e cá dentro sente
que a vida é semente de sangue e suor
que homem não morre apenas descobre que a morte é mais nobre que simples viver

Texto (recitação 6)

Hoje sei, sei, sei!
Fui povo, fui raça.
Sou o fim , não sou o primeiro
Hoje sei, sei, sei!
Sou a morte
Trouxe a vida
Fui pioneiro.

Sete Povos
Claudio Boeira Garcia Letra e Música

Espanha vestida
de Dona do Sol
Portugal parecia
o Dia do Mal
Pay Abarê,
Qual foi meu pecado?
Exilio ou morte do Povo Aldeado!
Pay Abarê, não quero a guerra
Pay Abarê, não entrego a Terra!

Texto (recitação 7)

Sei, sei, sei…
Me ouviram! Mataram! Salvaram! Estudaram!
Cantaram! Choraram! Entenderam! Escravizaram!
Embelezaram! Enjaularam!
Classificaram Prisioneiro!

Hoje sei, sei, sei,
Vou seguindo solidário ou sozinho
Muitos sois! Muitas Luas!
Muda a noite, Muda o dia!
Hoje sei, sei, sei,
Vou morrer, mais um pouquinho
Tanta morte suportei….

Funeral Guarany
Letra Jose Waldir Souza Garcia. Música Jose Rafael Koller

Canção de um Índio morto
Nas vozes de índio, selvagem canção.
São sombras que gemem, de brava Nação,
Cidades e campos
Restaram ruínas
Restos de um Povo
Amor, disciplina.
Do amor pela terra
A guerra nasceu
Sem ela sou nada
Meu povo morreu
Canção de um índio morto.

Texto (recitação 8)

Hoje sei, sei, sei!
Meu suor lavou a terra! Meu sangue Misturou na terra!
Minha Morte Renasceu na Terra!
Minha luta tremeu a Terra/ Minha morte desarma a guerra!
Meu tempo não tem encerra!

Dança da Lagoa do Sol
Jose Waldir Souza Garcia.

Melodia para flauta de taquara. Inspirada em dança imaginaria de povos originários da Lagoa dos Patos. Arranjos para flautas e percussão Os Tapes.

Continente Americano
Cláudio Boeira Garcia

Cláudio Boeira Garcia

Continente Americano
Coração gosto de sal

Quantas noites de esperança
Quantos séculos de distância
Que o irmão não diz bom dia
Que a mãe não vive em paz.

Continente Americano
Coração gosto de sal

Eu sonhei com toda América
Irmã gêmea, muito igual
Acordei mal humorado
Com a verdade desigual

Continente Americano
Coração gosto de sal

Nesta pele, multicores
Neste ventre, mineral
Nos calores do aconchego
Ouço um grito matinal.

Continente americano
Coração gosto de sal.